Ninguém sabe quando tudo muda

Crónicas 30 junho 2021  •  Tempo de Leitura: 2

Ninguém sabe quando o tapete debaixo dos nossos pés pode decidir falhar-nos.

 

Ninguém sabe quando mudam todas as regras do jogo que a própria vida parece ser.

 

Ninguém sabe, ao certo, o que está guardado para si, depois de se rasgar mais uma folha daquele calendário de mesa.

 

Não sabemos quando será o dia em que a doença decide visitar-nos e fazer casa em nós. Ou quando decide acampar entre os nossos.

 

Não sabemos quando será o dia em que a morte se veste de cerimónia para vir buscar-nos. Ou para levar um dos nossos.

 

O que sabemos é que nunca estamos prontos. Não estamos prontos para as mudanças, para atirar a toalha ao chão. Não estamos prontos para perder, para ficar doentes, para chorar a partida de alguém. 

 

O que sabemos é que, quando menos esperamos, o pano fecha-se e as luzes apagam-se sem pedir autorização a nenhum astro. A nenhuma estrela. 

 

De que serve ter consciência disso? De que serve estar a estas horas do dia a pensar em morrer e em viver? Em estar doente ou ter saúde?

 

Serve para acordarmos. Para percebermos que o que hoje visita a casa de um desconhecido pode, amanhã, vir bater à nossa porta. Serve para despertar. Para perceber que não somos daqui e que não há lugares marcados neste território de viver. Somos todos temporários. Fugazes. Aprendizes que nunca chegam a saber o suficiente para deixar de se espantar com esta aventura louca que são os (nossos) dias.

 

Enquanto não acordamos, a vida passa. Muda e quieta. A roubar dias, a plantar rugas, a obrigar-nos a comprar truques para disfarçar o envelhecimento do corpo e da alma. 

 

Enquanto não levantamos os pés do chão, a vida rebola sobre as nossas cabeças. Vai avisando. Dizendo que vai sendo tempo de fazer diferente aqui. E ali. E seguimos apressados como quem tem horas para chegar ao dia de ser, finalmente, feliz.

 

Enquanto o dia de ser feliz não chega, chegas tu?

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Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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