A Lâmpada do Advento

Crónicas 30 novembro 2025  •  Tempo de Leitura: 2

Na pequena aldeia de Vale Sereno, o inverno chegava sempre mais cedo do que nos outros lugares. As manhãs eram cinzentas, e o nevoeiro pousava nos telhados como um velho lençol esquecido. As pessoas caminhavam depressa, encolhidas nos casacos, como se a estação fria lhes roubasse também a esperança.

 

Mas havia uma casa diferente — a de Dona Ester.

 

Ester tinha já mais de oitenta anos, e ninguém se lembrava de a ter visto triste. Era conhecida por cuidar das plantas mesmo no frio, por acender sempre uma pequena lâmpada à janela ao anoitecer e por sussurrar orações enquanto mexia a sopa.

 

Na primeira semana do Advento, como todos os anos, Ester colocou a sua velha coroa de ramos sobre a mesa. As quatro velas tinham alturas desiguais, mas ela gostava assim: dizia que a fé também era feita de imperfeições.

 

Nessa tarde, ouviu-se uma leve batida à porta.

 

Era Samuel, um rapaz de doze anos, tímido e de olhar inquieto.

— Dona Ester… posso ficar um bocadinho?

 

Ela sorriu e abriu a porta, como quem abre o coração.

— Claro, meu filho. Aqui ninguém chega por acaso.

 

Samuel entrou e sentou-se à mesa, olhando a coroa de Advento como se fosse um tesouro.

— A minha mãe anda muito cansada. O meu pai está longe. Às vezes parece que esta casa está tão escura…

Os olhos marejaram, mas ele desviou o rosto.

 

Ester acendeu a primeira vela.

— Sabes, Samuel, o Advento começa sempre com uma pequena luz. Não resolve tudo, mas mostra o caminho.

 

O rapaz ficou alguns minutos em silêncio, olhando para a chama que tremeluzia suavemente.

Sérgio Carvalho

Cronista

Professor e Jornalista (CP 7993)

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