Quão bem te conheces?

Crónicas 27 outubro 2021  •  Tempo de Leitura: 3

Não sei se nos conhecemos assim tão bem. Se sabemos o que nos faz andar, o que nos faz recuar, o que nos faz abrandar ou perder o passo certo. Não sei se temos consciência do que nos faz arder o coração. Do que nos faz perder a paciência. Do que nos faz derreter a alma do lado de dentro.

 

Não sei se podemos (chegar a) conhecer alguém verdadeiramente se não sabemos, ao certo, de que meandros (e de que florestas) somos feitos.

 

Parece simples este mergulhar no que somos interiormente. Eu… sou só eu! E isso parece bastar. Mas o que me habita… o que nos habita por dentro não é, na maioria das vezes, assim tão linear. Estamos presos às expectativas que os outros têm para nós e, por isso, temos a tentação de nos adequar ao que os outros querem. Sem percebermos, quando o fazemos, estamos a anular parte do que nos constitui como pessoas, como seres à procura de sentidos para a vida.

 

Estamos reféns dos padrões que a sociedade, a escola, a família, os círculos de amigos nos impuseram. Às vezes, deixamos de saber quem somos porque queremos, simplesmente, agradar aos que partilham mundo connosco. Não nos incendiemos: os outros também não têm “culpa” dos padrões que os controlam. Tudo está enleado há muitas gerações, muitos ciclos viciados e repetidos. Vivemos numa sociedade obcecada com a “normalidade” quando nada do que nos acontece parece sê-lo. Vivemos num mundo em que os que correm para o mesmo lado são os mais aplaudidos e em que se deixam sozinhos os que querem andar ou, até, ficar parados, num canto, a ouvir os pássaros. Vivemos em comunidade, mas escolhemos o nosso umbigo, as nossas necessidades, as nossas manias como regentes de tudo o que fazemos e queremos.

 

Que espécie de mundo é este em que só podemos ser o que está escrito nos livros antigos? Não poderemos, nós, escrever livros novos? Com páginas a estrear?

 

Que espécie de pessoas somos se continuamos a olhar de lado para os que pensam diferente, escolhem diferente, amam diferente?

 

Que espécie de futuro oferecemos aos mais novos se lhes enchemos as mochilas de tarefas, competições, expectativas, pressões e muito pouco amor?

 

As perguntas ficam contigo. Que também contas para as respostas que se escreverem.

 

O que te parece? Arriscamos a escrever diferente?

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Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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