Quando puderes, não julgues!

Crónicas 22 julho 2020  •  Tempo de Leitura: 3

Somos imbatíveis na forma como julgamos os outros. Dentro da nossa cabeça, vamos criando cenários incríveis que justificam as atitudes alheias. Infelizmente, os cenários que imaginamos nunca são os melhores (para os outros).

 

Temos particular interesse por assumir que sabemos o que se passa na vida que não nos pertence. Os julgamentos sucedem-se dentro de nós porque, na verdade, é muito mais fácil criar uma versão dos acontecimentos que nos favoreça do que perguntar, conhecer, investigar a verdade de cada coisa e de cada situação.

 

Se uma pessoa nos diz algo menos simpático num ou noutro dia é porque é uma maldisposta e uma antipática.

 

Se uma pessoa se atrasa uma vez ou outra e falha um compromisso ou um determinado horário é porque não tem respeito por ninguém e é uma irresponsável.

 

Se uma pessoa tem, no trânsito, uma atitude menos cordial é porque é uma besta.

 

Se uma pessoa nos responde de forma mais assertiva é porque é mal-educada.

 

Se uma pessoa se emociona com facilidade é porque não tem grande estrutura emocional.

 

Se uma pessoa não se emociona com facilidade é porque é um calhau.

 

Estes raciocínios, quase imediatos, que nos parecem inevitáveis tornam-se regra dentro de nós se não tentarmos contrariá-los. Claro que é mais fácil julgar o outro e retirar-lhe as características de pessoa que, obviamente, terá. Se transformamos alguém numa palavra generalista e negativa não estamos a ser justos. Estamos, apenas, a querer ser preguiçosos e a querer ter pouco trabalho interior.

 

Quando tentamos colocar as pessoas no mesmo degrau em que nos colocamos, acabamos por conseguir torná-las mais parecidas connosco e a nossa tolerância aumenta de uma forma inevitável. Para nós é mais fácil encontrar desculpas. Para os outros não costuma haver desculpa possível. É preto ou branco. Sem zonas intermédias.

 

Vale a pena tentar fazer um exercício um pouco diferente enquanto vamos convivendo:

 

Se alguém que eu conheço fez ou faz alguma coisa que eu não gosto tenho sempre a hipótese de lhe dizer isso mesmo. Confrontando a pessoa com a sua atitude e não transformando a atitude dela no seu carácter. No entanto, nem sempre conseguimos chegar a esse confronto (porque não nos conhecemos bem, porque não há essa confiança).

 

Assim, e não podendo apurar as razões que levam alguém a agir de determinada forma, vale a pena dar o benefício da dúvida. Talvez esta pessoa esteja a ter um dia mau. Talvez esteja doente. Talvez tenha descoberto algo doloroso sobre alguém que ama. Talvez viva profundamente sozinha. Talvez não saiba como ser melhor.

 

Quando mudamos a paisagem tudo fica um pouco mais bonito, não é?

Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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