É tão bom falar dos outros

Cartas a uma amiga 9 agosto 2025  •  Tempo de Leitura: 4

Sabe tão bem, e sentimo-nos tão superiores e importantes! Achamo-nos sabedores de tudo, donos da verdade e capazes de arranjar solução para tudo para os outros...só que não! Ouço muita gente a comentar a vida dos outros, e apesar de cheios de boas intenções, tecem julgamentos sobre o que fazemos ou não fazemos.

Num caso muito claro e concreto dou por mim a refletir nos anos em que estive desempregada. Eu, como muitos, fartamo-nos de estudar, esforçamo-nos por ser boas pessoas e procuramos um emprego onde nos pudéssemos sentir bem e digno das nossas humildes competências. Sabem, apesar de ter inúmeros amigos, de pouco me valeu, pois quando nos toca a nós parece que não há nada.

Sentimos palmadinhas nas costas e olhos de piedade mas por trás muitos julgamentos: “tens de começar por baixo”; “tens de te agarrar a qualquer coisa”, “está a ser muito esquisita”, “esse trabalho é muito complicado”; "emigra"…..

Sabem porque escrevo isto? Porque continuo a sentir isto por parte de muita gente em relação aos desempregados que só revela uma coisa: falta de empatia. Quando são os “nossos” queremos o melhor para eles, porque os conhecemos e acreditamos que merecem ser felizes num emprego digno mas, às vezes, para os outros, qualquer coisa serve. E se não encontras um emprego, não és só tu que começas a duvidar, são os outros que fazem questão de nos fazer duvidar das nossas competências.

Quem está desempregado sabe bem o que digo. 

Sabe bem a quantidade de currículos que manda sem respostas. 

Sabe bem a quantidade de “cunhas” que viu serem aplicadas, e a quantidade de amigos que não se atravessaram. Ao contrário do que alguns pensam eu não acho que todos os que estão desempregados “não querem trabalhar”. Querem, e querem muito, mas não querem ser escravos nem reféns de gente que explora como se estivesse a oferecer uma coisa maravilhosa em troca de uma esmola. Se estiverem atentos vão perceber que nem sempre as ofertas que existem são verdadeiras, e não, as pessoas geralmente não são chamadas para tudo que concorrem e rapidamente entram numa espiral depressiva: eu já lá estive!

O resultado é que temos vergonha de assumir que estamos desempregados, ou até de pedir um jeitinho, porque o outro vai sorrir pela frente mas por trás, vai tecer comentários injustos que quer queiram quer não, acabamos sempre por saber.

Se estás desempregada, não desanimes nem te contentes com menos do que o que achas que te faz feliz.

Se conheces alguém que está desempregado, abre os olhos, ouvidos e a boca, não para falar mal mas para procurar algo para essa pessoa. Tu podes muito bem ser a Esperança que ao outro falta, mas tem em conta que essa pessoa não precisa de uma favor, mas de um amigo. E se esse recusar alguma oferta, avalia com amor a sua decisão, vais descobrir algo precioso.

Enquanto isso, que sirva de reflexão para todos os que são prontos a julgar e a criticar os “outros”. Sabe bem, não sabe? O problema é quando os outros são os “nossos”.

E tu amiga, quando falas dos outros?

Raquel Rodrigues

Cronista "Cartas a uma amiga"

Raquel Rodrigues nasceu no último ano da década 70 do século passado. Cresceu em graça e em alguma sabedoria, sendo licenciada em Gestão, frequenta o mestrado em Santidade: está no bom caminho!

Aproveita cada oportunidade para refletir sobre os sentimentos que as relações humanas despertam e que, talvez, sejam comuns a muitas pessoas. A sua escrita é fruto da vontade de partilhar os seus estados de alma com a “amiga” que pode bem ser qualquer pessoa que leia com disposição cada uma das suas cartas.

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