Recuperar a Decência

Crónicas 22 dezembro 2025  •  Tempo de Leitura: 4

Na ala oeste da Casa Branca, Trump colocou um "Hall of Fame" com descrições dos anteriores presidentes e no caso de Joe Biden (o único que não tem fotografia) começa—"O Dorminhoco Joe foi, de longe, o pior presidente na História Americana."— Este episódio divulgado pelas notícias perturbou-me. A decência é reconhecer a dignidade do outro mesmo quando isso não traz vantagem nenhuma. Se os EUA são o país mais poderoso do mundo, que exemplo dá este episódio da decência?
 
Estamos em plena época de Natal com os habituais anúncios a apelar ao sentimento para consumir, mas a centralidade desta época está própria palavra e refere-se a alguém que nasce. Sabemos que se trata de Jesus-menino, Deus que Se coloca numa posição de grande fragilidade. A cultura americana, que se afirma como cristã, tem influenciado profundamente toda a cultura humana, desde a alimentação ao estilo de ser. Mas este e outros tantos episódios que aconteceram em 2025 fazem-me pensar na importância e urgência em voltarmos o nosso olhar para uma cultura mais decente e fundacional, como a cristã de origem, em vez de qualquer sua expressão nacionalista.
 
Quem tem razão naquilo que diz, escreve ou faz, não fere o outro, mas eleva-o porque essa é a atitude da decência cristã. Mas "ter razão" implica ser verdadeiro e a verdade supera o que se diz, escreve ou faz. Por exemplo, nos cartazes do candidato presidencial André Ventura lemos que os "Imigrantes não podem viver de subsídios", mas os jornalistas do Público investigaram este aspecto e os factos mostram que isso não é verdade (ver aqui). A decência cristã começa pela verdade.
 
É difícil ver a indecência ter voz, e estar surda à voz de quem a questiona, sobretudo quando nos entra pelo ecrã ou pelos olhos, sem nada podermos fazer para repor a verdade com alguma decência. Porém, a vivência da decência começa no lugar onde a vida realmente acontece: em casa.
Neste Natal, não vale a pena contar as histórias que envergonham o outro, mesmo que estejamos a fazê-lo em "tom de brincadeira", podendo optar pelas histórias decentes de gratidão que sublinham como aquele irmão, tia, filho ou avó são geniais e insubstituíveis.
Dada a polarização que se vive intensamente por todo o lado, não vale a pena querer ganhar numa discussão, mas vale mais a arte da pergunta que procura realmente compreender com decência e, se não for possível partilhar pontos de vista, orientar a conversa para as histórias das alegrias passadas como forma de recomeçar.
 
Por fim, não há gesto mais eficiente para exercer a decência como a pausa, o curto silêncio que precede a resposta sensata. Uma pausa numa troca de impressões dá espaço ao tempo de suscitar o pensamento de que a atitude mais decente para elevar o outro, mesmo quando discordamos dele, é por vezes calar e imaginar um abraço. Porém, se se proporcionar, abraçar mesmo porque não há nada mais decente do que o calor humano sinceramente partilhado.
 

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Aprende quando ensina na Universidade de Coimbra. Procurou aprender a saber aprender qualquer coisa quando fez o Doutoramento em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico. É membro do Movimento dos Focolares. Pai de 3 filhos, e curioso pelo cruzamento entre fé, ciência, tecnologia e sociedade. O último livro publicado é Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo e em filosofia, co-editou Ética Relacional: um caminho de sabedoria da Editora da Universidade Católica.
 
 
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