Onde ancorar o nosso olhar?
Para todos aqueles que se encontram numa situação difícil: a morte de um familiar ou amigo; a dura luta contra uma doença oncológica... A vida não é fácil.
Com o passar dos anos tomamos consciência que a experiência da vida não é simples nem leve. Tal como os israelitas no livro dos Números. (Nm 21, 4b-9)
E isto vale para todos. Certamente, existem situações extremas. Gente que vive na primeira pessoa a doença, a guerra, a fome ou os desastres naturais. Mas mesmo para os poupados a tais desastres, as dificuldades da vida apresentam-se em toda a sua complexidade.
Por mais que nos sintamos financeiramente seguros, sabemos que o dinheiro não é tudo e, acima de tudo, não garante a serenidade e o verdadeiro bem-estar. Em última análise, todos nos vemos a ter de lidar com o fim da nossa existência, e ter ou não dinheiro resume-se a muito pouco.
Da dureza da vida, da qual ninguém está isento, emerge precisamente a fragilidade desta, onde simplesmente ter alimento não chega, onde, tal como as serpentes no deserto, tudo nos traz insegurança, vulnerabilidade e sofrimento. Para enfrentar os perigos do deserto, Moisés, a mando de Deus, constrói uma serpente de bronze e pendura-a num poste: olhar para esta serpente significa estar salvo das suas mordeduras.
É o sinal que Deus envia para que o povo cansado possa reaprender a confiar, a acreditar no Seu amor. E é interessante que Deus não elimina as serpentes, que continuam a morder o povo. Mas oferece um antídoto mais forte do que o veneno, com o poder de curar. O mal permanece, mas não conduz necessariamente à morte.
Paradoxalmente, o povo não deve lutar contra as serpentes, não deve tentar eliminá-las. Nunca o conseguirá, porque sozinhos não conseguimos derrotar o mal.
Jesus reinterpreta este sinal a partir daquele que será o seu destino enquanto homem crucificado: «E, assim como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo aquele que nele crê tenha a vida eterna.» (Jo 3, 14-15)
A sua vida e morte são como a serpente levantada, visível por todos, e quem olha para ela vê algo que o pode curar. Na cruz vemos o amor do Pai por cada um de nós: «Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigénito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.» (Jo 3, 16).
O mal não desapareceu. Existe, e é um mal que gera a morte, um mal que procura perturbar o caminho para a liberdade, para a terra prometida, para a vida eterna. O mal que é, em última análise, falta de confiança, falta de amor.
Aqueles que levantam os olhos e contemplam o Senhor pendurado na cruz já não podem acreditar que Deus não os ama. A cruz é o antídoto que nos pode salvar. Só a cruz o pode fazer.