O que quero com o jejum e a abstinência?

Crónicas 9 março 2021  •  Tempo de Leitura: 3

Ainda jejuamos na Quaresma? A pergunta não é nova. Mas todos os anos sou questionado sobre a prática do jejum e da abstinência. Por brincadeira, costumo responder que é um desafio que me ponho sempre que me olho ao espelho e digo a mim mesmo: "Paulo, tens que perder peso!"

 

Durante este tempo favorável, já escrevi sobre a necessidade da conversão para uma vida voltada para o essencial, sem máscaras; sobre o silêncio necessário para este regresso; sobre a peregrinação que é a condição necessária para ver o sentido da nossa vida; agora quero dissertar sobre estas exigências que a Igreja nos propõe.

 

Jejum e abstinência não fazem qualquer sentido na vida cristã se forem um fim em si mesmo! Será muito similar àquele que se propõe fazer uma dieta sem, concomitantemente, levar uma alimentação regrada e saudável acompanhada por exercício físico. Percebe-se o porquê. Acaba a dieta, volta tudo ao normal ou ainda pior. Assim é com a disciplina quaresmal.

 

Esta renúncia não é um fim em si mesma. mas orienta-se para a abertura do coração e da mente, para uma existência evangélica, na qual o Espírito possa inscrever, a nova vida salva em Jesus Cristo. É também o caminho para uma maior solidariedade e partilha com tantos irmãos que têm fome de pão e de paz. A renúncia começa justamente com a capacidade de escolher, em liberdade, o que se entende não ser indispensável à vida; dizer "não" estrutura-nos como pessoas e como crentes e abarca toda a dimensão do humano, dos sentimentos, da corporeidade, das necessidades que fazem parte da natureza humana e que podem ser orientadas por valores transcendentes para a plenitude da vida.

 

O jejum ou a abstinência alimentar deve, portanto, orientar-se para a conversão de toda a nossa existência que se abre aos outros, no dom de si.

 

Assim entendo o Angelus do Papa no passado dia 28 de Fevereiro. Francisco, com a clareza que já nos habituou, falou da necessidade de um jejum muito particular: o da bisbilhotice e da calúnia para com os irmãos. Ele definiu várias vezes o mexerico como "terrorismo da tagarelice". O termo "terrorismo" é forte mas expressa muito bem o seu poder devastador.

 

Muitos são os motivos que nos levam a murmurar: às vezes temos inveja do bem dos outros e não podemos suportar que outros desfrutem de dons particulares; outras vezes, "desprezamos" algumas pessoas para descarregar a nossa raiva e realizar uma pequena, mas terrível vingança; outros ainda, porque satisfazemos a nossa necessidade de nos sentirmos superiores aos que criticamos. Lembremos que denegrir é diabólico e visa apenas semear a discórdia, dividir famílias e comunidades, insinuar suspeitas em todos.

 

Tantas vezes confundimos o que é miseravelmente egoísta e mau com a verdade, a franqueza, a caridade e a liberdade. Levianamente, não refletimos sobre as palavras que saem de nossa boca e sobre os pensamentos que habitam a nossa mente, causando danos irreparáveis. 

 

Se o Jejum e a abstinência não servir para a nossa conversão integral, não serve para nada.

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail