A Lâmpada do Advento: A quarta vela
Na pequena aldeia de Vale Sereno, o inverno chegava sempre mais cedo do que nos outros lugares. As manhãs eram cinzentas, e o nevoeiro pousava nos telhados como um velho lençol esquecido. As pessoas caminhavam depressa, encolhidas nos casacos, como se a estação fria lhes roubasse também a esperança.
Mas havia uma casa diferente — a de Dona Ester.
Ester tinha já mais de oitenta anos, e ninguém se lembrava de a ter visto triste. Era conhecida por cuidar das plantas mesmo no frio, por acender sempre uma pequena lâmpada à janela ao anoitecer e por sussurrar orações enquanto mexia a sopa.
Na primeira semana do Advento, como todos os anos, Ester colocou a sua velha coroa de ramos sobre a mesa. As quatro velas tinham alturas desiguais, mas ela gostava assim: dizia que a fé também era feita de imperfeições.
Nessa tarde, ouviu-se uma leve batida à porta.
Era Samuel, um rapaz de doze anos, tímido e de olhar inquieto.
— Dona Ester… posso ficar um bocadinho?
Ela sorriu e abriu a porta, como quem abre o coração.
— Claro, meu filho. Aqui ninguém chega por acaso.
Samuel entrou e sentou-se à mesa, olhando a coroa de Advento como se fosse um tesouro.
— A minha mãe anda muito cansada. O meu pai está longe. Às vezes parece que esta casa está tão escura…
Os olhos marejaram, mas ele desviou o rosto.
Ester acendeu a primeira vela.
— Sabes, Samuel, o Advento começa sempre com uma pequena luz. Não resolve tudo, mas mostra o caminho.
O rapaz ficou alguns minutos em silêncio, olhando para a chama que tremeluzia suavemente.
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A segunda vela
Na semana seguinte, Samuel voltou.
— A minha mãe chorou ontem, disse ele. — Disse que sente saudades do meu pai. E eu não sei o que fazer.
Ester acendeu a segunda vela e aproximou-a da primeira.
— Quando alguém sofre, a nossa presença é a segunda vela. Mais pequena, mas junta à outra. A luz cresce quando não a deixamos sozinha.
Samuel ficou a pensar nisso. Ao regressar a casa, sentou-se ao lado da mãe sem dizer nada. Ela sorriu-lhe, apenas por ele estar ali.
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A terceira vela
Na terceira semana, quase correu até casa de Ester.
— Hoje consegui fazer a minha mãe rir, contou radiante. — Contei-lhe a história do cão do senhor Joaquim que tentou ladrar à própria sombra!
Ester riu-se também e acendeu a terceira vela.
— A alegria é sempre um sinal de Deus a sussurrar: “Ainda estou aqui”.
O quarto parecia agora menos frio. As chamas iluminavam o tempo e aqueciam o silêncio.
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A quarta vela
Chegou enfim o último domingo do Advento. O vento trazia um cheiro de lareira acesa, e a aldeia preparava discretamente o Natal.
Samuel bateu à porta com um embrulho nas mãos.
— É para si, Dona Ester. Fiz na escola. Não é nada de especial…
Era um pequeno anjo de madeira, tosco e inclinado, mas cheio de ternura.
Ester acariciou-lhe a cabeça, emocionada.
Depois acendeu a quarta vela. Todas juntas, as chamas pareciam uma só.
— Vês, Samuel? A esperança, a presença, a alegria e agora o amor…
É assim que o Menino encontra lugar para nascer.
Não é numa casa perfeita. É num coração preparado.
O rapaz respirou fundo.
— Então… talvez Ele possa nascer na minha casa também.
— Claro que pode, respondeu Ester. — Já começou. Tu foste a primeira luz.
E, enquanto as velas ardiam, o Advento fazia aquilo que sempre faz quando lhe damos espaço: transformava o inverno em promessa e a escuridão em caminho.