Amas-me como sou?
Se perguntarem aos jovens qual é o seu maior medo, na grande maioria, responderão que é o medo de ficar sozinhos. Mais uma vez constatei esta realidade ao falar de uma famosa peça de teatro escrita em 1897 por Edmond Rostand: Cyrano de Bergerac.
Cyrano de Bergerac é um herói romântico, que combate a covardia, a estupidez e a mentira. Ele amava a Madeleine Robin (Roxanne), uma rapariga inteligente, mas um tanto pedante, que gosta de ser cortejada com palavras bonitas e originais. O jovem Christian também a ama, mas não sabe falar com brilhantismo, ao contrário de Cyrano, que tem o dom da palavra. Cyrano, sem esperanças de conquistar a Roxanne, pela razão de ser bastante feio, resolve ajudar Christian a conquistá-la através das palavras.
O medo é inerente à humanidade, mas surpreende nesta era de partilha constante. Embora hiper-conectados, estamos hiper-desligados, e social não é sinónimo de bons e verdadeiros relacionamentos, mas de solidão em massa. Isso porque a única maneira de evitar de se sentir sozinho é reconhecer a própria singularidade. Ou seja, querer bem a si mesmo e ser desejado pelo que se é. Se isso não acontece, não se deve às redes sociais, mas aos relacionamentos pessoais e familiares.
O problema de hoje, segundo especialistas, é que os jovens preocupam-se mais com o que os outros sentem por eles. Por essa razão, usam as redes sociais para a mascarar o verdadeiro eu. Mas se é a representação de mim que é amada, e não eu, é natural sentirmo-nos sozinhos mesmo numa multidão. O conceito de autoestima, tão difundido hoje em dia, é um corretivo enganoso quando usado nesta máscara, porque alguém que não se sente amado pelo que de facto é, não pode amar-se a si mesmo. Os nossos seguidores não podem dar-nos amor porque não alcançam o verdadeiro eu. É a produção que fazemos de nós mesmos que é amada, não nós.
Tal como Cyrano de Bergerac, onde o protagonista, apaixonado por Roxanne, não tem coragem de declarar seu amor por causa da feiura do seu rosto, marcado por um nariz gigantesco, e se limita a emprestar as palavras de corte ao seu jovem pretendente, Christian, tão bonito quanto vazio. Christian é como o perfil de Cyrano nas redes sociais. Num certo momento, na cena memorável em que, escondido, ele dita suas palavras de amor a Christian, pergunta à amada: "Você me amaria mesmo se eu fosse horrível?" Ou seja: mesmo que fosse eu mesmo? Como sou e não como me produzo?
A pergunta de Cyrano é a pergunta de todos: "Posso ser amado mesmo sendo feio?" Aqui, o feio não é estética, mas a verdade que eu sou, com a singularidade das minhas limitações e imperfeições.
As redes sociais, que falam numa linguagem comercial, onde se recebe atenção apenas porque se vende ou seduz, não podem alimentar a vida interior. A vida espiritual é uma vida amada livremente pelo que é.
O medo da solidão dos jovens combate-se com o desejo de se livrar das representações com as quais o ego acredita que merece existir, e ser amado pelo que se é.