Tudo está relacionado com tudo

Crónicas 29 setembro 2020  •  Tempo de Leitura: 3

Na última crónica citei o Papa Francisco na celebração de 27 de Março, onde nos chamou à atenção esta realidade: viajamos todos na mesma embarcação. Muitos acreditam ou defendem que não viajamos no mesmo barco, apesar de enfrentarmos a mesma tempestade.

 

A verdade é que a imagem evangélica evocada por Francisco é eficaz e simbólica. Ela sintetiza a condição sem precedentes em que se encontra a nossa humanidade. Todos os problemas assumiram dimensão planetária. E tudo está relacionado com tudo.

 

Mas o nosso tempo é marcado por um paradoxo: quanto mais interdependentes estamos, menos solidários somos. De facto e apesar de vivermos num mercado global ainda não fomos capazes de despertar e optar por uma verdadeira colaboração entre povos. Esse paradoxo agrava e gera uma fragilidade generalizada. E Francisco compreendeu bem que, esta consciência da fragilidade comum, pode ajudar a assumir a fraternidade universal como princípio político e económico. Neste sentido, realmente estamos todos no mesmo barco.

 

A crise da pandémica revelou que, na realidade, a mais profunda crise do nosso tempo é uma crise cultural. Ou seja, a dificuldade, por parte da tecnocracia dominante, de conceber a complexidade dos problemas. A crise da saúde deixa claro o quão complexos, entrelaçados e indissociáveis, são os fios da globalização biológica, antropológica, económica, política, psicológica, espiritual... 

 

A especialização, a tecnocracia trouxe muito conhecimento. Mas esse conhecimento é incapaz de compreender os problemas globais, que são compostos de muitas dimensões entrelaçadas. A crise mostra que não pode haver respostas técnicas únicas para problemas isolados. A Interdependência significa que vivemos num ecumenismo, ou seja, torna o mundo verdadeiramente um: a casa comum. "De Wuhan, rapidamente chegou a todo o mundo."

 

O Papa Francisco destacou com clareza que os problemas e as crises do nosso tempo obrigam-nos a pensar num horizonte planetário e de longo prazo, não podemos ter uma visão para resultados imediatos. O Santo Padre, há cinco anos, com a Laudato Si tinha dito claramente: "tudo está conectado", "tudo está em relação" ... 

 

Precisamos de uma verdadeira fraternidade! Uma fraternidade fundada no sentimento de pertença recíproca. Até agora temos vivido, de uma forma geral, em comunidades "fechadas", enquanto países ou nações. A fraternidade dentro da comunidade, criou um inimigo potencial: aquele que está fora da minha comunidade. Com esta pandemia e, creio, pela primeira vez, a fraternidade pode tornar-se concretamente universal.

 

Na verdade, a humanidade encontra-se numa condição sem precedentes: tornou-se capaz de se autodestruir, isto é, de suicídio, com as armas nucleares, com a exploração do meio ambiente que reduz a biodiversidade e muda o clima. E essa possibilidade, esse perigo, de repente transformou-nos a todos como uma comunidade com o mesmo destino: ou nos perdemos juntos ou nos salvamos juntos.

 

Por esta razão volto às palavra de Francisco naqueles dias de terror e confinamento. Depois de ver a tentativa de voltar à vida dita de normal, interrogo-me se percebemos a nossa realidade e necessidade de uma fraternidade universal…?

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

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