Dentro

Crónicas 27 fevereiro 2020  •  Tempo de Leitura: 2

Inicia-se um tempo que é muito mais do que de jejum e abstinência. É a oportunidade de renovar o nosso interior. Por isso, cada dia lança-nos o desafio de (re)aprender a olhar dentro.

 

Dentro temos os nossos pensamentos, as emoções e uma imensidão de processos químicos, uns a funcionar melhor do que outros. Este dentro encontra-se ao nível da percepção que temos da realidade, mas não a esgota. 

 

Há um outro dentro que se liga ao sentido e significado que damos a tudo o que nos acontece e o que sucede, também, à nossa volta. Nem sempre é fácil entender esse sentido e significado porque o ruído e as fontes de distracção são tais que ofuscam o olhar, ensurdecem os ouvidos, desgostam o paladar, entopem o nariz e arrepiam o tocar. Porém, com uma particularidade, a de nem nos darmos conta disso porque a mente vive viciada e anestesia todos os sentidos. 

 

O caminho que este período quaresmal nos propõe é o de recuperar a consciência plena de todos os sentidos. Esse estado relacional da consciência no qual estamos activamente cientes do presente, questionando o que é novo e o modo como contextualizamos essa novidade na nossa vida.

 

Questionar o que está a mais implica ter a coragem de viver dos actos concretos. Por exemplo, jejuar das redes sociais, consultando-as apenas uma vez por dia durante 5 minutos.

 

Questionar o que nos prende demais implica ter a coragem de viver no desapego. Por exemplo, deixar o telemóvel numa outra divisão da casa enquanto dormimos, e arranjar um despertador simples e barato para acordar a horas. 

 

O caminho quaresmal propõe-nos um renovar interior que hoje não inclui somente a vida física, mas também a digital. Por isso, o jejum e a abstinência que nos convidam a viver no essencial têm expressão em todas as dimensões da nossa vida, sobretudo no tempo de ecrã que a preenche mais do que noutros tempos.

 

Neste sentido, diria que, de hoje em diante, a Quaresma inclui o desatafulhar digital para reencontrar o tempo e o espaço que tanto nos faltam, de modo a enriquecer e aprofundar os valores que nos levam a sorrir e a amar em cada instante.

Aprende quando ensina na Universidade de Coimbra. Procurou aprender a saber aprender qualquer coisa quando fez o Doutoramento em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico. É membro do Movimento dos Focolares. Pai de 3 filhos, e curioso pelo cruzamento entre fé, ciência, tecnologia e sociedade. O último livro publicado é Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo e em filosofia, co-editou Ética Relacional: um caminho de sabedoria da Editora da Universidade Católica.
 
 
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