Uma história antiga
Era uma vez um homem rico... e um homem pobre à sua porta. O rico não tem nome, o pobre tem o nome do amigo de Jesus, Lázaro. Um está vestido de feridas, o outro de púrpura. Um está no topo do mundo, o outro está na porta das traseiras. Os dois protagonistas cruzam-se, mas não se encontram. Entre eles existe um abismo.
No próximo fim de semana celebraremos o Dia Mundial do Migrante e do Refugiado. «Os migrantes e os refugiados recordam à Igreja a sua dimensão peregrina, sempre em busca da pátria definitiva, sustentada por uma esperança que é virtude teologal», disse o Papa Leão sobre este tema. E é no confronto com estas palavras que me vem à cabeça o Evangelho do passado domingo.
Talvez o rico seja um grande crente, que observa os Dez Mandamentos e reza: «Ó Deus, inclina o teu ouvido à minha súplica», porém, é surdo ao apelo do pobre. Pisa-o todos os dias como um charco de água. Nem sequer pensa em parar, em tocar-lhe. O pobre Lázaro é invisível...
O rico não fez mal ao pobre; não o agrediu nem o expulsou. Fez algo pior: não lhe permitiu existir, reduziu-o a lixo, a algo descartado, a nada. Lázaro era invisível aos seus pensamentos. Ninguém tem o direito de reduzir o outro a nada. A indiferença cria abismos entre as pessoas.
Quem é este rico? Não seremos todos nós quando… Quando estamos mais interessados em conhecer a vida dos ricos, dos famosos, dos poderosos, do que ajudar os mais pobres. Sabemos tudo sobre eles e nem tão pouco reparamos no pobre que está ao nosso lado. Por inveja ou desejo queremos conhecer o nome dos ricos mas ignoramos, não damos existência aos pobres, àqueles que precisam e suplicam a nossa ajuda.
Por que razão o rico é condenado? Por causa da sua riqueza, das suas roupas finas, da sua boa comida? Não! Deus não é moralista. O pecado do rico é o abismo com Lázaro: nem um gesto, uma migalha, uma palavra. Cavam-se abismos entre as pessoas, erguem-se muros.
O homem rico procura erradamente o sentido da vida. O Evangelho alerta-nos contra a subtil tentação de nos alimentarmos apenas a nós próprios. O rico devora a vida e guarda-a para si. Todos nós estamos expostos àquela voz que nos incita continuamente a pensar primeiro em nós próprios: Pensa primeiro em ti! Salva-te!
O homem rico é a forma de vida: vestia-se e festejava luxuosamente. Vestir-se e comer são as nossas maiores preocupações. Preocuparmo-nos com a forma como nos vestimos e comemos, significa preocuparmo-nos com a imagem que projetamos para os outros, significa preocuparmo-nos com a forma como os outros nos vão julgar. O nosso status.
O pecado não é a riqueza em si, mas a indiferença, a incapacidade de ver as necessidades dos outros. Se sabemos abrir os olhos, partilhar e sermos próximos.
Hoje, no dia que celebramos a memória de São Jerónimo, peçamos ao Senhor que nos ajude a conhecer a Sua Palavra e a ser testemunhas peregrinas do Seu Amor.