Conto: E eles seguiram o mestre...

Conto 15 outubro 2020  •  Tempo de Leitura: 14

Era uma vez um homem chamado Jesus. O seu estilo de vida era cativante e aquilo que dizia ou não dizia e quanto fazia ou deixava de fazer era objeto inúmeras considerações, a favor ou contra. Uns elogiavam-no pela sua coragem e determinação e outros havia que o criticavam e condenavam. A verdade é que não havia quem nunca tivesse ouvido falar dele ou não tivesse vontade de o ver e falar consigo.

 

Algumas pessoas eram sobretudo curiosos e procuravam Jesus apenas para terem tema de conversa ou para confirmarem se ele fazia mesmo milagres ou se era um falso profeta que procurava enganar o povo, como outros o haviam feito já. Instalavam-se à porta das casas onde ele entrava ou ficava hospedado, acompanhavam-no sempre que ia ali ou acolá e adoravam dar palpites e trocar dois dedos de conversa com toda a gente sobre ele.

 

Havia, também, homens e mulheres que eram, essencialmente, interesseiros pois procuravam Jesus para pedir um milagre para si ou para alguém dos seus, para serem abençoados, curados, ou até para comer e beber sem pagar. Eles não acreditavam propriamente na divindade de Jesus e apenas o viam como um grande profeta que era capaz de fazer magias, feitiçarias ou milagres. Por outro lado, achavam muito tentadora a ideia de o proclamar rei para enfrentar os romanos e satisfazer-lhes todo o tipo de vontades e necessidades.

 

Havia, ainda, pessoas que procuravam Jesus por toda a parte porque, pura e simplesmente, gostavam de ouvir as suas histórias e as mensagens que transmitia. As suas palavras e os seus gestos de amizade e ternura para com toda a gente seduzia-as e inspirava-as pois ele transmitia-lhes paz e serenidade, apesar de não olharem para ele como o Filho de Deus.

 

Por fim, ao redor de Jesus, havia aqueles que acreditavam do fundo do seu coração que ele era o Messias, o Cristo. Assim como Deus tinha libertado o povo de Israel da escravidão do Egito, voltara a visitar novamente o seu povo através da encarnação do seu próprio Filho numa mulher de Nazaré, chamada Maria. Este grupo de pessoas confiava profundamente em Jesus e era um testemunho de fé e perseverança no Salvador.

 

Toda a gente falava da fé dos irmãos de Betânia, Lázaro, Marta e Maria, da cananeia, da samaritana, do centurião romano, de Jairo, de José de Arimateia, de Nicodemos, dos leprosos que foram curados, de Zaqueu que subira a uma árvore para ver Jesus e o recebera em sua casa, da mulher com um problema grave de saúde que acreditou que bastava tocar nas vestes de Jesus para ficar curada, dos cegos que voltaram a ver, do paralítico descido pelo telhado pelos amigos para chegar perto dele e pedir a sua cura e de tantos outros.

 

A primeira e grande seguidora de Jesus fora a sua própria mãe que, desde o ventre materno, o acolhera e acompanhava para toda a parte. Concebera-o no coração, antes mesmo de o conceber no seu seio e, desde o seu nascimento até à morte na cruz, era raro não a vislumbrar perto do filho. Partilhou toda a sua vida e missão com fé e ternura.

 

Muitos aproximavam-se de Jesus porque as suas palavras e a sua forma de olhar e viver a existência era de tal forma irresistível que se deixavam tocar e seduzir e expressavam-lhe a sua mais sincera vontade de o seguir para todo o lado, para estarem com ele e partilharem a sua obra. Queriam ser seus discípulos pois consideravam-no um verdadeiro mestre e optavam por deixar tudo quanto tinham e faziam para imitar o seu modo de vida. Contudo, Jesus afirmava sempre a radicalidade de um amor total e sem concessões a outras coisas ou pessoas.

 

Numa ocasião, um escriba que acompanhava Jesus cheio de generosidade e boa vontade, aproximou-se e disse-lhe que queria segui-lo para onde quer que fosse. No entanto, Jesus respondeu-lhe, dizendo que as raposas tinham as suas tocas e os pássaros do céu possuíam os seus ninhos, mas ele não tinha sequer onde reclinar a cabeça. Na verdade, ele adotara um estilo de vida itinerante, sem lugar de repouso fixo nem sítio concreto e cómodo para ensinar. Quem o quisesse acompanhar deveria estar disposto a uma forma de viver austera que implicava muitas renúncias já que ele não era propriamente como outros mestres ou reis deste mundo.

 

Numa outra altura, Jesus viu alguém perto dele e convidou-o a que o seguisse. A sua felicidade foi enorme, mas pediu-lhe que, antes de o começar a fazer, lhe permitisse ir sepultar o seu pai pois havia falecido havia pouco tempo. Contudo, apesar da sua resposta positiva, Jesus não apreciou muito as reticencias apresentadas, dizendo-lhe que deixasse que os mortos enterrassem os seus mortos e que ele fosse anunciar o Reino de Deus, pois nada nem ninguém estava acima do amor de Deus.

 

Noutro momento, um homem fascinado com a pessoa e missão de Jesus, foi no seu encalço e disse-lhe que o seguiria, mas pediu que lhe permitisse ir despedir-se dos seus amigos e familiares. Então, Jesus aproveitou para sublinhar a grandeza e nobreza do amor a Deus, em comparação com outros amores humanos, e afirmou que se alguém pusesse a mão no arado e olhasse para trás não era apto para o Reino de Deus.

 

Um dia, estava Jesus a falar a uma grande multidão junto ao lago de Genesaré e viu dois pescadores que, depois de saírem dos seus barcos, lavavam as redes. Então, pediu a um deles que pudesse entrar no seu barco e dali falar às pessoas para que o pudessem ver e ouvir melhor. No final do seu discurso, disse a um, de nome Simão Pedro, que se fizesse ao largo e lançasse as redes para a pesca. Contudo, ele respondeu que haviam trabalhado durante toda a noite sem terem apanhado nada, mas que eles fariam o que ele lhes dissera.

 

A verdade é que, surpreendentemente, apanharam uma enorme quantidade de peixe, a ponto de quase se romperem as redes e terem necessidade de pedir ajuda aos companheiros de outro barco. Encheram completamente dois barcos e quase se afundaram, tal o peso da pescaria. Ao ver tamanha quantidade de peixe, Simão caiu aos pés de Jesus e disse-lhe que se afastasse de si, pois era um homem pecador. O mesmo aconteceu com outros dois homens chamados Tiago e João que estavam espantados com aquilo que tinham acabado de ver.

 

Então, Jesus disse a Simão que não receasse e que gostaria que ele, em vez de ser pescador de peixes, se tornasse pescador de pessoas. Sem perceberem muito bem o significado e alcance daquelas palavras, confiaram na sabedoria e bondade de Jesus, levaram os barcos para terra e, deixando tudo, seguiram-no.

 

Jesus calcorreava toda a região a anunciar o Evangelho e a convidar toda a gente para o Reino de Deus e decidiu escolher e completar um grupo de homens para estarem com ele, serem seus discípulos e enviá-los em missão: Simão, por sobrenome Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão; Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; Simão, o Zelote, e Judas Iscariotes. A maior parte eram pescadores e tornaram-se os seguidores e amigos mais próximos de Jesus.

 

Como doze eram os patriarcas das doze tribos de Israel, o povo escolhido por Deus para receber a sua revelação, Jesus quis também escolher doze apóstolos para o novo Israel que congregava toda a humanidade. Considerava todas as pessoas do mundo uma só família e dizia que todas podiam chamar Pai a Deus. Todos eram irmãos porque todos possuíam a mesma dignidade de criados à sua imagem e semelhança e desafiados a acolher a graça da salvação que ele propunha e oferecia.

 

Os doze discípulos caminhavam com Jesus e ficavam maravilhados com as coisas que ele dizia e fazia diariamente. Estavam verdadeiramente encantados com a Boa Nova do Reino que ele apresentava e desejava ver enraizada no coração daquele povo que estava longe de viver os Mandamentos dados a Moisés.

 

Os doze ficavam sem palavras ao presenciarem os milagres que o Mestre fazia e que outra coisa não eram senão sinais de que o Reino havia chegado para todos. Havia cegos que passavam a enxergar, surdos que podiam ouvir novamente, mudos que começavam a falar, leprosos que ficavam curados, mortos que ressuscitavam, paralíticos que passavam a andar e endemoniados que ficavam livres de todo o mal.

 

Jesus escolheu, ainda, outros setenta e dois discípulos e enviou-os, dois a dois, à sua frente a todas as cidades e lugares aonde ele havia de ir. Disse-lhes que a seara era grande, mas que os funcionários eram poucos e que, por isso, deveriam pedir ao dono que enviasse mais trabalhadores.

 

Dizia-lhes que fossem, mas que tivessem consciência de que a missão era delicada e difícil, pois eram enviados como se fossem cordeiros para o meio de lobos. Aconselhava-os a não levarem bolsa, nem alforge, nem sandálias e que não se detivessem a saudar ninguém pelo caminho. Em qualquer casa onde entrassem, deveriam desejar e dizer primeiramente que a paz estivesse ali bem presente e se as pessoas fossem de paz, sobre elas repousaria a sua paz. Se não, ela voltaria para eles.

 

Dizia-lhes, ainda, que o trabalhador merecia o seu salário e, por isso, em qualquer casa em que entrassem ou povoação onde fossem recebidos, que aceitassem comer e beber do que lhes oferecessem e curassem os doentes que encontrassem, pois o Reino de Deus estava próximo.

 

Após a morte e ressurreição de Jesus, muitos acreditaram nele e converteram-se ao Evangelho, apesar das perseguições dos romanos que também tinham os seus deuses e até acreditavam na divindade do próprio Imperador. Por outro lado, os judeus não acreditaram que Jesus fosse o Messias enviado por Deus e que tanto esperavam, e achavam que as pessoas que seguiam os seus ensinamentos eram hereges como ele. Por isso, eram vistas como uma seita a eliminar a todo o custo, já que era cada vez maior o número daqueles que acreditava nele.

 

Entre aqueles que mais perseguiram os seguidores de Jesus estava um homem que se chamava Paulo e era de Tarso.  Era um israelita que observava rigorosamente a religião judaica e tinha o estatuto de cidadão romano. Impulsionado pelo entusiasmo impetuoso da juventude e abrasado pelo desejo de proselitismo judaico, acreditava que a sua missão religiosa era combater esse grupo que tinha abandonado a lei mosaica para seguir Jesus e que dizia que ele tinha ressuscitado.

 

Um dia, Paulo estava a caminho de Damasco para procurar e prender os seguidores de Jesus e levá-los para Jerusalém como prisioneiros, para serem interrogados e, eventualmente, executados. A determinado momento, ficou ofuscado por uma luz muito forte, a ponto de deixar de ver, e caiu desamparado do seu cavalo. Então, ouviu a voz de alguém que o questionava sobre as razões de o perseguir. Após lhe ter perguntado quem era, a resposta foi que era Jesus, a quem ele perseguia.

 

A partir daquele momento verdadeiramente extraordinário, Paulo tornou-se um dos maiores seguidores de Jesus e um dos mais importantes apóstolos no anúncio da Boa Nova em variadíssimas regiões do Império Romano. A sua conversão a Jesus mudou radicalmente o curso da sua vida, levando-o a uma intensa atividade missionária e tornando-o num dos mais importantes escritores do pensamento do Mestre.

 

Paulo escreveu cartas a todas as comunidades cristãs que visitou durante vários anos e aproveitava para falar da doutrina do nazareno. A sua liderança e influência nos primeiros tempos da Igreja foram notáveis e, segundo o que deixou escrito, em Antioquia os seguidores de Jesus foram chamados de ‘cristãos’ pela primeira vez.

Paulo Costa

Conto

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