Livro da Semana: «A tarde dos cristianismo - o tempo da transformação»

Livros 3 novembro 2022  •  Tempo de Leitura: 6

A Tarde do Cristianismo discute as transformações da fé na vida humana e na história, o autor apresenta a atual crise da Igreja como uma transição para uma nova etapa na história do cristianismo. Apresenta uma visão do Cristianismo do futuro como uma comunidade ecuménica, capaz de uma compreensão nova e mais profunda de seus próprios recursos, bem como dos problemas atuais da época.

 

A Igreja e sua fé é cristã na medida em que é Páscoa: morre e ressuscita dos mortos. Existem muitas formas de fé em nível pessoal e na jornada da Igreja através da história que um dia deve morrer. Às vezes os crentes passam pela escuridão da Sexta-feira Santa, o sentimento de que Deus os abandonou, quando a forma habitual de fé morre. Mas quem perseverar nestas noites escuras, mais cedo ou mais tarde poderá experimentar a luz da manhã de Páscoa, a transformação da sua fé.

 

Ficha Técnica

Título: A tarde do cristianismo. O tempo da transformação
Autor: Tomáš Halík
Ano de edição: 2022
Editora: Paulinas
Idioma: Português
Páginas: 312
Peso: 390g
ISBN: 9789896738525

 

Publicamos a seguir um excerto do último capítulo.

O futuro do Cristianismo
 

Qual será o futuro do Cristianismo? Se o mistério da Encarnação prossegue na história do Cristianismo, então devemos estar preparados para que Cristo continue a entrar criativamente no corpo da nossa História, em diferentes culturas – e a entrar muitas vezes com a mesma discrição e anonimato com que outrora entrou num estábulo em Belém. Se o drama da crucificação prossegue na História, devemos aprender a aceitar que muitas formas de Cristianismo morrem dolorosamente, e que essa morte inclui horas sombrias de abandono, até mesmo uma «descida ao inferno». Se, no meio das mudanças da História, a nossa fé deve permanecer ainda uma fé cristã, então o sinal da sua identidade é kenosis, autoentrega, autotranscendência.

Se o mistério da Ressurreição prossegue na história, então devemos estar preparados para buscar Cristo não entre os mortos, no túmulo vazio do passado, mas para descobrir a Galileia de hoje («a Galileia dos gentios»), onde o encontraremos surpreendentemente transfigurado. Ele voltará a atravessar as portas fechadas do nosso medo, mostrará as suas feridas. Estou convencido de que esta Galileia de hoje é o mundo dos nones para lá dos limites visíveis da Igreja.

Se a Igreja nasceu do Pentecostes, e este evento prossegue na sua história, então ela deve tentar falar de uma forma que possa ser compreendida por pessoas de diferentes culturas, povos e línguas; deve aprender constantemente a compreender as culturas estrangeiras e as diversas línguas da fé; deve ensinar as pessoas a entenderem-se. Trata-se de falar claramente, mas não de forma simplista; acima de tudo, deve falar com credibilidade – «coração a coração» 268. Deve ser lugar de encontro e de diálogo, fonte de reconciliação e de paz 269.

Muitos dos nossos conceitos, ideias e expectativas, muitas formas da nossa fé, muitas formas de Igreja e Teologia devem morrer – eram muito pequenas. A nossa fé deve superar os muros construídos pelos nossos medos e pela nossa falta de coragem para, como Abraão, nos aventurarmos por caminhos desconhecidos num futuro incógnito. Nas nossas novas jornadas, encontraremos provavelmente aqueles que têm as suas próprias ideias surpreendentemente pouco familiares acerca do rumo e do destino do caminho, mas mesmo esses encontros são um dom para nós; devemos aprender a reconhecê-los como o nosso próximo e a tornarmo-nos seus próximos.

O respeito pela diversidade e a aceitação do outro na sua singularidade, esta dimensão do amor que é o critério da sua autenticidade, é necessária não só nas relações entre indivíduos, mas também nas relações entre nações, culturas e religiões. A importante frase na declaração conjunta do Papa Francisco e do Imam Ahmed el-Tayeb, de que o pluralismo e a diversidade das religiões são queridos por Deus na Sua sabedoria, é fruto de milhares de anos de experiência, pagos por inúmeras vítimas de guerras religiosas. Esta frase suscitou ressentimento em certos círculos religiosos: não será uma traição à pretensão da nossa religião à sua própria verdade?

Não: é a linguagem de uma fé madura, adulta, desprovida do narcisismo coletivo e do egocentrismo daquelas comunidades religiosas incapazes de reconhecer a sua condição peregrina. Para os muçulmanos, isso significa regressar a uma importante e sábia passagem do Alcorão, que afirma explicitamente que Deus deseja uma diversidade de religiões e que essa diversidade é uma oportunidade de porfiar no bem; para os cristãos, um aprofundamento da visão de Nicolau de Cusa de que, na diversidade, uma única verdade nos é dada (una religio in rituum varietate). Não tenhamos medo: a mais alta forma de verdade para o Cristianismo é o amor de Deus e do homem; onde quer que aconteça, Deus, Cristo e a fé cristã estão presentes. Se a Igreja hoje pode atestar esta confiança num Deus que é maior do que todas as nossas ideias, definições e instituições, algo de novo e importante acontece: entramos na tarde da fé.

O ecumenismo é uma forma indispensável de amor cristão. É uma das facetas mais credíveis e convincentes do Cristianismo. Para que a Igreja Católica seja verdadeiramente católica, deve completar a transformação que começou no Concílio Vaticano II: a mudança do catolicismo para a catolicidade. Todas as Igrejas e todos os cristãos que recitam o Credo dos Apóstolos ou o Credo Niceno-Constantinopolitano proclamam assim o seu dever de desenvolver a catolicidade do cristianismo: aquela abertura da Igreja que reflete os braços abertos de Jesus na Cruz. Ninguém está fora do amor de Cristo.

O portal iMissio é um projeto de evangelização iniciado em 2012, que tem tido como objetivo dar voz a uma comunidade convicta de que a internet pode ser um ambiente de evangelização que desafie o modo de pensar a fé. Tem pretendido ser espaço de relação entre a fé, a vida da Igreja e as transformações vividas atualmente pelo Homem.

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