A dúvida de João

Liturgia 14 dezembro 2019  •  Tempo de Leitura: 3

No fim da vida, preso injustamente, perguntava se era mesmo verdade, se o que ouvia dizer era sinal da realização da sua pregação, se o que comentavam nas ruas desalinhadas significava a chegada definitiva do Messias.


Andava de um lado para o outro, espreitava pela pequena abertura no topo da cave húmida e quando podia, trocava umas mensagens com algum amigo. Procurava a confirmação da confirmação. Queria acreditar, mas faltava-lhe sempre mais uma prova.


Até agora tudo fazia sentido. Tudo o que se dizia d’Ele era coerente ainda que desconcertante.


Tinha de aguentar. Aguentar a prisão. Pior ainda: suportar a dúvida. Não havia outro remédio. Ele já tinha feito a sua parte. Pregara e batizara. Enfim, tinha inquietado os homens com a temática da proximidade do juízo de Deus - «está perto… convertei- vos… será sem piedade…». Agora ouvia dizer que… «sim, talvez o juízo de Deus não fosse bem assim, mas como seria?».


Já não havia mais nada para fazer além de esperar e rezar. Rezar sobretudo para compreender os novos sinais. Aquelas mensagens associadas ao novo Mestre da Galileia, cujas paredes de uma prisão não detinham. Esperar pacientemente. Paciência que havia de ser testada até ao limite, sabemos hoje.


O homem solitário e vigilante espera em oração para compreender o que surge de novo e inesperado: um Messias diferente daquele que ele tinha anunciado. Um Messias que falava mais do amor do que do castigo de Deus. Um Deus surpreendentemente próximo e compreensivo em relação às fragilidades de cada homem. Um Deus, enfim, paciente com as travessuras e a má vontade dos homens e das mulheres, mas que, mesmo assim, não desistia de andar por aí, naquelas ruas poeirentas e sujas, a anunciar a chegada do novo Reino. Ele acreditava e tornava-se crível.


Pior do que estar preso, pior do que a fome e o frio daquela escura cela era a torturante dúvida. O desconcertante Messias estremece as conceções de Deus do velho e condenado profeta. Aguarda silenciosamente pela sua vez. Ora enquanto espera o momento da execução. Não teme a espada, mas sim a dúvida persistente.


A espera paciente e orante é recompensada. Certo dia reconhece o Messias. Já não precisa de mais relatos. As obras falam por si: «os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e a Boa Nova é anunciada aos pobres». Então, João acredita e aceita. Nada o faz temer. Nem a escuridão, nem o frio, a fome ou a espada. Acredita e confia. E sua fé paciente torna-se um desafio em cada advento.

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