Não podemos viver sem catedrais…

Crónicas 21 julho 2020  •  Tempo de Leitura: 3

Sem querer escandalizar ou provocar alguém, acredito que há sempre um lado positivo num acontecimento trágico. Podemos aprender sempre algo de novo. O incêndio na Catedral de Nantes deste fim de semana, pode e deve ser uma nova lição.

 

Não houve vítimas e os danos parecem ser menos graves do que se pensava inicialmente. Não deixa de ser uma tragédia, o seu restauro vai ser longo e caro. No entanto, podemos agradecer a Deus não apenas porque tudo poderia ter sido muito pior, mas e acima de tudo pelo que aconteceu imediatamente a seguir. Num "mundo secularizado", que parece ter perdido toda a sua identidade, existe sempre, mais cedo ou mais tarde, um lugar divino que nos lembra quem somos. Aliás, como já acontecera com a Notre-Dame em Paris quando todos se voltaram para a sua reconstrução.

 

Uma igreja, uma catedral: não um palácio presidencial, não um parlamento, não um quartel militar, não um estádio de futebol… Podemos seculariza-nos, ou até tornarmo-nos ateus, mas para lembrar quem e o que somos profundamente, mais cedo ou mais tarde, uma Casa de Oração ressurge. Centra-nos no que deve ser o essencial.

 

O mesmo se passa com Santa Sofia, Istambul. Perante a noticia da transformação deste museu em mesquita, não foi apenas o Papa Francisco que se demonstrou «muito desolado»! Todos os olhos do mundo se concentraram em Hagia Sophia que desde a sua construção, em 537 até 1453, foi a principal Igreja do Império Bizantino e também a maior de todo o mundo. Apenas no período entre 1204 e 1261,  que se seguiu ao saque da capital imperial pela Quarta Cruzada, foi convertida numa uma catedral católica romana. Posteriormente, a partir de  29 de maio de 1453 até 1931, foi transformada numa mesquita. Em 1931 com a queda do império otomano foi secularizada e reabriu como um museu em 1 de fevereiro de 1935.

 

Abro um parênteses para esclarecer o nome deste edifício classificado pela UNESCO. A igreja foi dedicada ao Logos, portanto a Jesus a segunda pessoa da Santíssima Trindade. A festa de dedicação foi realizada em 25 de dezembro,  data em que comemoramos o Nascimento de Jesus, a encarnação do Logos.  Embora ela seja chamada de "Santa Sofia", "sophia" é a transliteração fonética em latim da palavra grega "sabedoria". O nome completo da igreja em grego é "Igreja da Santa Sabedoria de Deus".

 

Mas nós, diante desta tragédia de Nantes, entendemos que sem catedrais não podemos viver. A catedral é um monumento à loucura: não uma loucura de quem está doente, mas a santa e sublime daqueles que ao construí-la, pretendiam criar um local preparado para que nos dias de grande solenidade, todas as pessoas da cidade pudessem encontrar o seu lugar. 

 

Que o desejo de as reconstruir não seja apenas pelo seu valor patrimonial, cultural e histórico, mas símbolo de uma reconstrução pessoal e comunitária onde procuramos ser ativos no lugar que ocupamos no seu interior.

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

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