Pão partido, pão partilhado

A Igreja vive da Eucaristia desde as suas origens. Nela, encontra a razão da sua existência, a fonte inesgotável da sua santidade, a força da unidade e o vínculo da comunhão, o vigor da sua vitalidade evangélica, o princípio da sua acção de evangelização, a fonte da caridade e o impulso da promoção humana.

 

Eucaristia em São Paulo

“Não é digno o vosso motivo de orgulho! Não sabeis que um pouco de fermento faz levedar toda a massa? Purificai-vos do velho fermento, para serdes uma nova massa, já que sois pães ázimos. Celebremos, pois, a festa, não com o fermento velho, nem com o fermento da malícia e da corrupção, mas com os ázimos da pureza e da verdade” (1 Cor 5, 6-8). Em Mt 13, 33 e Lc 13, 21, o fermento aparece sempre referido como capaz de, apesar de em pequena quantidade, ser suficiente para contaminar tudo. Daí o pão ázimo aparecer como símbolo de pureza e verdade. Enquanto o cordeiro representa Cristo, o pão ázimo torna-se símbolo da existência cristã, sinal de um novo começo.

O relato da instituição da Eucaristia mais antigo não se encontra nos Evangelhos mas na carta de São Paulo aos Coríntios. Paulo exorta os coríntios a recordar o verdadeiro sentido da Eucaristia por eles celebrada e a evitar abusos introduzidos na celebração do rito. São Paulo reafirma vigorosamente que não é lícita uma celebração da Eucaristia onde não resplandeça a caridade testemunhada pela partilha concreta com os mais pobres.

A Eucaristia é uma Nova Aliança, a Aliança renovada do Sinai. Para São Paulo, a Eucaristia é anúncio da morte redentora e a permanência do sacrifício de Cristo no mundo novo. Esta tem indelevelmente inscrito o evento da paixão e morte do Senhor. É o sacrifício da cruz que se perpetua através dos séculos. OCorpo de Cristo será dado por vós (1Cor 11,23). No corpo de Jesus entregue por todos nós e no cálice com sangue derramado em sacrifício, “funda-se a Nova Aliança, tal como a antiga aliança entre YHWH e os Israelitas mediante a aspersão do sangue do cordeiro imolado.”  

A Eucaristia é também um sacramento escatológico. O sacrifício de Cristo permanece no mundo novo. A morte de Cristo desemboca na verdadeira “vida que não acaba mais” (Rm 6,9). É a era escatológica dos bens futuros ao lado da qual a era presente não é senão uma sombra (Hb 10,1; 8,5; Cl 2,17). O sacrifício foi feito uma vez por todas (Hb 7,27; 9,12.26ss; 10,10). O seu sangue substituiu definitivamente o sangue ineficaz das vítimas da Antiga Aliança (Hb 12,24); aboliu a Antiga (Hb 8,13) e proporcionou a herança eterna (Hb 9,15).

Receber o corpo eucarístico de Cristo, a sua vida de Ressuscitado, é deixar-se acolher nesse espaço onde a morte já não existe e onde o Espírito sugere «o que os olhos não viram, os ouvidos não ouviram, o coração do homem não pressentiu, isso Deus preparou para aqueles que o amam» (1 Cor 2,9).

“O Senhor Jesus na noite em que era entregue, tomou pão e, tendo dado graças, partiu-o e disse: «Isto é o meu corpo, que é para vós; fazei isto em memória de mim». Do mesmo modo, depois da ceia, tomou o cálice e disse: «Este cálice é a nova Aliança no meu sangue; fazei isto sempre que o beberdes, em memória de mim.» Porque, todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciais a morte do Senhor, até que Ele venha” (1 Cor 11, 24-26). Este anunciar a morte do Senhor inclui, para os que participam na Eucaristia, o compromisso de transformarem a vida, de tal forma que esta se torne eucarística. A Eucaristia é tensão para a meta, antegozo da alegria plena prometida por Cristo.

A Eucaristia exprime a natureza da existência cristã no mundo “enquanto esperamos a vinda gloriosa de Cristo, nosso salvador”. É o momento privilegiado em que a Igreja experimenta o seu ser peregrina a caminho da pátria definitiva.

A Eucaristia na Igreja

O verdadeiro sacramento é a Igreja, à imagem de Jesus Cristo, Ele próprio Sacramento do Pai, que se manifesta através dele. A Igreja, em Cristo, é como que o sacramento, ou sinal, o instrumento da íntima união com Deus e da unidade de todo o género humano (LG 1). Ela é povo reunido na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo (S. Cipriano) e por isso mesmo sacramento da comunhão trinitária. Mas a Igreja, sacramento por excelência, exprime-se nos sete sacramentos, estando os outros seis vinculados com a sagrada Eucaristia à qual se ordenam (SC 16). Sendo a Eucaristia o próprio Cristo, Pão vivo que nos dá a vida, os outros sacramentos de iniciação existem para tornar possível o acesso a tal sacramento. O sacramento do Baptismo, pelo qual somos configurados a Cristo, incorporados na Igreja e feitos filhos de Deus, constitui a porta de acesso a todos os sacramentos; através dele somos inseridos no único Corpo de Cristo (1 Cor 12, 13).

Fundamental em Paulo a perspectiva da ceia do Senhor como sinal e construção do Corpo de Cristo que é a Igreja. A linguagem da fracção do pão e do cálice partilhado é a mesma: Cristo como princípio difusor de Vida Nova! Difundiu o seu Espírito que anima e faz a comunidade pela dinâmica dos carismas. Torna-a Corpo de Cristo! Rasgar a comunidade é rasgar o Corpo de Cristo. Se não há ágape no início do encontro da comunidade, como poderá haver fracção do pão no fim? (1Cor 11, 17-34)

Comunhão e unidade no Corpo de Cristo

Na Eucaristia, recebemos o corpo do Senhor e tornamo-nos, assim, um só corpo com Ele; recebemos todos o mesmo corpo e tornamo-nos, por isso, nós próprios “um só em Cristo” (Gal 3, 28). Ao dar a sua vida por nós, Jesus oferece-nos assim a possibilidade de entrarmos numa comunhão com ele e, por conseguinte, entre nós. Se, no plano humano, a alimentação e a bebida são assimiladas por aquele que come e bebe, pela comunhão com o corpo e com o sangue de Cristo é Ele que nos assimila a si próprio: Tornamo-nos naquilo que consumimos, o Corpo de Cristo, prolongamento da presença activa de Cristo no mundo.

Assim a Eucaristia é a verdadeira sarça-ardente, na qual Deus manifesta o seu nome: Javé, ou seja – segundo o genuíno significado de Isaías – “Aquele que está, que está presente” (Is 3, 14). 

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