Domingo de Ramos: O padecimento de um Deus apaixonado!

A nossa subida atingiu a meta mas não chegou ao fim. Estamos à porta da Semana Maior. Estamos à porta da cidade de Jerusalém. Hossana! Hossana ao Filho de David, gritavam as gentes louvando entusiasticamente Aquele que montava um burrito. Dias mais tarde maldiziam e condenavam à morte Aquele que aclamaram como Rei.

 

“Deus vem à minha cidade, anónima e cheia de rostos, ao meu país amado e suportado, do qual fujo e ao qual regresso; Deus vem ao meu coração contorcido, à minha vida. Para Ele não existem cidades inabitáveis, nenhum homem a quem Ele não diga: «Hoje tenho de ficar em tua casa» (Lc 19, 5). Entra em minha casa, no meu mundo, um homem que, no entanto, abala todas as regras: foi Menino numa manjedoura, vem desarmado, montado num burrico, pende da cruz, ressuscita de noite, dá-se na humildade do pão e do vinho. Identifica-se com aquele que sofre. E julgar-me-á com estas palavras «Tive fome, tive sede, era estrangeiro» (cf. Mt 25, 35)” (Ermes Ronchi – A Esperança que Nasce da Palavra, Paulinas Editora).

 

“Começa a semana suprema, a semana central da história e da fé, e, de repente, o tempo abranda a velocidade. Enquanto os longos trinta e três anos da vida de Jesus estão como que condensados e incluídos no decorrer de um ano litúrgico, agora, entre este domingo e o próximo, o tempo dilata-se, adota outro ritmo; somos chamados a seguir o dia a dia, quase hora a hora, a última semana de vida de Jesus: desde a entrada em Jerusalém até à corrida de Madalena na manhã de Páscoa” (Ermes Ronchi).

 

Para lá sobem as tribos do Senhor, para lá sobe o próprio Senhor que, gratuitamente se entrega por toda a humanidade de todos os lugares e tempos, de todas as culturas e tradições.

 

No Evangelho que a liturgia propõe para a bênção dos ramos, vemos um Jesus que triunfa a entrar em Jerusalém, porém, as profecias no Antigo Testamento anunciam um Messias humilhado, maltratado, oprimido e morto. É este o Messias. Hoje, tal como há dois mil anos atrás, a imagem de um Messias derrotado é motivo de escândalo. Porém, é este o Messias. Assumindo a condição humana, à mais frágil condição humana, como Servo foi conduzido à morte numa Cruz e Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes (cf. Filip 2, 6-11).

 

Este ano litúrgico segue o relato da Paixão segundo o Evangelho de S. Mateus. Mateus, que escreve para os Judeus, ao longo do relato faz questão de chamar a atenção para o cumprimento das Escrituras em Jesus de Nazaré. Jesus não se deixa abandonar a um destino descrito nos profetas ou sofrer a humilhação e o escarnio descritos no Salmo 22. Jesus, durante o relato da Paixão, é mais do que nunca o homem livre e senhor de todos os acontecimentos e momentos; domina tudo o que se sucede em catadupa com plena liberdade e consciência dos factos.

 

O Homem que pende da Cruz, nu e desprezado, humilhado e maltratado é o mesmo que deu a vista aos cegos, curou os paralíticos, acolheu o “resto de Israel”, deu vida a quantos dele se aproximavam, lavou os pés aos discípulos e ainda hoje continua a lavar e a curar as nossas feridas e tornou-se alimento para a longa e difícil caminhada. Ali está o nosso Deus de braços abertos porque ama!

 

Mateus escreve que, no momento em que Jesus exalou o último suspiro, o véu do templo rasga-se em duas partes de alto abaixo. A terra tremeu e as rochas fenderam-se. Abriram-se os túmulos e muitos corpos de santos, que estavam mortos, ressuscitaram; e, saindo dos túmulos depois da ressurreição de Jesus, entraram na cidade santa e apareceram a muitos” (Mt 27, 51-53). Estes sinais apocalípticos assinalam já o que vai acontecer no final da história: pela Morte e Ressurreição de Jesus o pecado e a morte foram vencidos e isto será revelado em plenitude quando todos nós formos chamados amorosamente à vida em Deus. Está presente a ideia de um novo mundo, uma nova criação, uma nova vida.

 

“Afirmava o Cardeal Carlo Maria Martini «A Igreja nasce da contemplação do rosto do Deus crucificado», a Igreja nasce ali, naquelas mulheres: as primeiras pedras vivas da Igreja são as mulheres. Se também nós quisermos ser pedras vivas, devemos deter-nos com essas mulheres ao lado das infinitas cruzes do mundo onde Cristo ainda está crucificado nos seus irmãos, é negado com os seus irmãos, expulso nos seus irmãos. Queremos velar com essas mulheres e com Santa Maria junto às cruzes infinitas da humanidade, onde hoje continua a paixão de Cristo, para lhes levar conforto, consolação, pão, humanidade, vida e esperança” (Ermes Ronchi).
 

Nuno Monteiro

Redator Liturgia.

Professor de EMRC. Adora viajar! Caminhante de Santiago de Compostela e Terra Santa.

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