Para onde vão os sonhos que nos morrem?!
O lado de dentro do peito é um albergue para sonhos. Cabem lá todos. Os de quando ainda não sabíamos nada sobre o mundo. Os que ganhámos quando conhecemos o mundo e os seus avessos e os que fizemos crescer dentro da vida que fomos construindo. Quem não sonha, não tem nada senão a vaga ilusão do que é a vida. Os sonhos acrescentam-nos dias. Dão-nos chama para continuar e asas para beijar o céu. Tenho tido sorte com os sonhos que me nasceram. Houve poucos que me morreram. A morte de um sonho é uma coisa séria. É como se alguma coisa se adiantasse aos nossos passos para depois se fazer desaparecer. É como se alguma coisa nos adiasse. É como se aquilo que mais queríamos fosse, precisamente, o que nos faz cair. Não sei para onde se encaminham os sonhos que nos abandonam. Talvez fiquem presos debaixo da vida para depois nascer numa outra forma. Ou talvez voem para o colo de Deus, que é o melhor de todos os lugares do mundo. O que sei é que os sonhos que nos morrem destapam as nossas esperanças mais queridas e sopram-nas. Para longe. Pensei que, talvez, pudéssemos emprestar um qualquer sonho a alguém. Que nos pudesse guardar. E ao nosso sonho também. Mas não existem pessoas assim. Os sonhos só existem porque são nossos e porque fomos nós que os criámos. Quando o damos a alguém, deixa de ser nosso e deixa de ser sonho. Quando um sonho desaparece, há uma razão para isso. Uma razão que não escolhemos. Uma espécie de barco que não vimos chegar. Uma porta que se fecha e que nos faz saltar para trás com o estrondo. Os sonhos verdadeiros são raízes que se agarram aos nossos pés. Quando a raíz se desata, há sempre uma marca que fica. A marca do que podia ter sido. Do que imaginámos. Do que quisemos. Do que desenhámos dentro da nossa cabeça. Do que (quase) vimos acontecer.
E, de repente, o sonho desaparece. Esfuma-se. Retira-se solenemente como se já não fôssemos dignos dele. Lágrimas. Punhos cerrados. Perguntas sem resposta.
Talvez a pergunta esteja errada. A verdadeira pergunta não é :
Para onde vão os sonhos que nos morrem?
A pergunta é esta:
Quando nos morre um sonho, para onde vamos?
Cronista
Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)