Faz sentido falar de «pecado» hoje?

Nos últimos tempos tenho tido algumas conversas cujo tema central é este: O Pecado! O que é o pecado para o Homem de hoje? Como se sabe, ninguém é perfeito e errar é humano: Qual o sentido e o "sentir" em falar de pecado?
 
Como já tenho lido e com o qual concordo em absoluto, mais do que falar em falta de sentido do pecado se deva falar em falta ou perda do sentido de Deus. De facto, quando a fé é menos vivida, Deus é colocado de fora da nossa existência. Os "profetas" da Sua morte já o afirmaram: Sem Deus, não há qualquer limite ao ser humano. Basta ler o filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) "Gott ist tot" - "Deus está morto".
 
Sem Deus esquecemos até a nossa condição de criaturas e assim aparecem os novos deuses, senhores do próprio destino. Vejamos a idolatria do corpo mal chega o calor. Dietas e ginásios como que morrêssemos jamais; Vejamos os temas "fraturantes" que têm sido sujeitos a alterações legislativas em Portugal: o aborto; "barrigas de aluguer"; casamentos e adoções... A superficialidade que se aloja no coração do ser humano, que anestesia as consciências. Todas as escolhas e opções, tornam-se licitas, porque senhores da nossa salvação.
 
A Escritura revela-nos, desde a Criação, que Deus quer o ser humano como seu "parceiro", numa relação dialógica e de reciprocidade. Somos responsáveis pela Criação e os primeiros interlocutores de Deus. O pecado rompe com esta relação e afasta-nos de Deus. O pecado é este agir longe do seu amor. Amor levado ao extremo em Jesus de Nazaré. Amor que ainda hoje é vivido pelo Espírito Santo. Deus continua a "pousar" sobre o ser humano o seu olhar de benevolência e de misericórdia. Parece-me que o Santo Padre, o Papa Francisco se tem "desmultiplicado" em textos, pregações e iniciativas que pretendem evidenciar este amor sem medida. Só assim compreendo este Ano Jubilar Extraordinário da Misericórdia.
 
Só quando cada um de nós se encontrar numa relação de "tu-a-tu" com o Senhor é que descobrirá a imensidade deste amor e o abismo entre nós e Ele. Deus é luz que mete a nu a nossa realidade. Faz-nos constatar e contatar com a nossa verdade e realidade, e assim, chama-nos a deixar tudo o que nos afasta do Seu amor.
 
E é aqui que fará sentido falar de pecado. Só "dentro" do olhar de amor misericordioso com o qual Deus nos olha, é que podemos ter o desejo de conversão e de mudança a que somos chamados. O reconhecimento da condição de pecador e de frágil, não diminui a dignidade do ser humano, criado para participar na mesma vida de Deus. Antes pelo contrário! Oferece-nos a possibilidade de purificar o coração e a vida, de tudo aquilo que realmente o perturba e não permite entrar no dinamismo do homem novo criado por Deus na Páscoa de Jesus Cristo.
 
Só quem tem um forte sentido da dignidade do Homem perante Deus, do seu destino eterno, é que pode perceber o quão grande é a tragédia do pecado e como a sua presença seja a perda de tudo aquilo que é verdadeiramente humano.
 
Uma boa semana.

Paulo Victória

Cronista

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

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