Conquistas e vitórias

 

«O Reino do Céu é semelhante a um tesouro escondido num campo, que um homem encontra. Volta a escondê-lo e, cheio de alegria, vai, vende tudo o que possui e compra o campo.» Mt 13,44 

 

 

 
A vida é feita de vitórias e derrotas, de perdas e de conquistas, uma constante procura pelo tesouro maior. Disso depende o sentido da própria vida. Mas quer umas, quer outras, custam muito: seja porque ninguém gosta de admitir que não é melhor ou capaz ou superior, ou seja, perder, seja porque as grandes conquistas exigem grandes esforços. Já diz a sabedoria popular, só valorizamos o que nos custa a alcançar, pois quando é oferecido não sabemos dar o devido valor às coisas.

 

A conquista, a vitória, é um ideal que nos move, que nos arranca do comodismo. Mas o primeiro sinal de inteligência é sabermos escolher as nossas batalhas e qual a melhor altura para as travar. É não viver permanentemente à espera de coisas grandiosas e esquecer-se das pequenas, daquelas que preenchem uma vida.
 
Perante uma oportunidade, quase instintivamente, na emoção do momento, tudo parece possível, qual super-herói, parece que basta querer... Mas nem sempre! O entusiasmo é bom, mas com os pés no chão.

 

Infelizmente, enquanto divago pelo shopping, às vezes parece que durante muito tempo educamo-nos e educamos as crianças na ilusão de que tudo depende de nós. Qualquer atitude sensata que discorde desse sonho seria imediatamente apelidada de um “ismo” qualquer. Cuidado! Sabemos que não é bem assim. Pior, até fico com a ideia de que estamos convencidos que o querer algo é a única condição para alcançá-la... O que foi feito do esforço e do sacrifício inerente a qualquer batalha ou conquista? Para quem assiste, no momento da vitória, da conquista do objetivo proposto, tudo parece fácil. Mas para os sujeitos das façanhas, a memória não esquece o árduo caminho percorrido.

 

Alcançar um campeonato exige esforço, sacrifício, disciplina, capacidade de viver as vitórias e as derrotas sem perder a noção do bem maior, persistência e resiliência. Sair de um plano de assistência financeira exige a um país um percurso semelhante embora bem mais doloroso do que uma mera questão desportiva à qual se adere por opção. A liberdade exige que alguém faça esse mesmo percurso de abnegação até da própria liberdade para que um povo possa comemorar um 25 de abril. A santidade exige esses mesmos valores inserindo-os num ideal de vida proposto por Cristo e transformando-a não num fim a alcançar mas no próprio caminho a ser percorrido dia a dia. Não é uma receita a seguir, um mapa traçado previamente... Há apenas uma vida a viver e depende de cada um escolher como.

 

Partindo do princípio que até nos dispomos a fazer os sacrifícios necessários para alcançar o que pretendemos, outra questão se levanta: será que todas as conquistas que almejamos merecem mesmo todo o nosso tempo, esforço e dedicação? Repito, há que saber escolher o que se pretende conquistar, qual o tesouro que merece que deixemos tudo para o possuir!

 

Não são poucos os dramas humanos e familiares que resultam não só da forma como se encaram as conquistas e os fracassos e como lentamente se perde o sentido de alguns sacrifícios em nome de um bem maior, bem como da frustração de atingir difíceis conquistas que afinal não foram vitórias pois não deram sentido ao esforço feito nem a satisfação duradoura esperada.

 

Perante a possibilidade de fracasso, ainda que a meta valha a pena, quando a vitória não é garantida ou exige muito esforço, será sempre mais cómodo, e para alguns mais sábio, nem sequer se perfilar; para os que vencem essa tentação inicial e não se deixam abater pelos obstáculos ao longo do caminho, arriscam-se a grandes conquistas, cada dia.

 

A Quaresma só pode ser entendida porque há Páscoa! Mas a Páscoa só é plenamente vivida se percorremos o deserto da Quaresma. E não há vitória maior que a da vida sobre a morte, nem conquista melhor que um sentido para a vida que ultrapassa a própria vida.

 

[Imagem: ©Luís Moreira]

Paulo V. Carvalho

Cronista.

Licenciado em Teologia. Pós Graduação em doutrina e ética social. Mestrado em Informática Educacional. Especialização em Educação Especial. Professor. Gosta de desafios.

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