A árvore que dava nove frutos diferentes

O avô Joaquim era daquelas pessoas com fama de agarrado ao dinheiro e que jamais alguém o vira a dar um presente ou uma esmola. Cauteloso e pragmático, passava os seus dias na agricultura e comprava apenas o que fosse essencial para a sobrevivência. A sua única preocupação era não ter que depender de ninguém na sua velhice e, por isso, acumulava todo o dinheiro que pudesse e que conseguia através da venda dos produtos da terra.
 
A sua mulher resmungava muitas vezes com ele por causa da sua forretice. Não davam um passeio, não iam de férias, não gozavam a vida e não passavam quase tempo nenhum com a filha que casara e lhes dera um netinho há um ano.
 
Um dia, o ancião, farto de ouvir as lamúrias da mulher, da filha e do genro, decidiu oferecer ao neto o melhor dos presentes que poderia existir. Pensou, pensou e voltou a pensar e tomou a sua opção. Ia oferecer-lhe uma árvore.
 
O avô Joaquim, além de batatas, cebolas, cenouras, couves e muitas outras coisas mais que cultivava, gostava muito de árvores de fruto. Tinha o mais viçoso pomar da aldeia e a quantidade enorme de frutos que conseguia era a menina dos seus olhos.
 
Lembrava-se muitas vezes de uma frase de Confúcio que dizia que se quiséssemos ter prosperidade por um ano, devíamos cultivar grãos, se quiséssemos ter êxito por dez devíamos cultivar árvores mas para conseguir sucesso por cem anos devíamos cultivar gente. E recordava, ainda, de uma ideia de Virgílio que dizia que os netos colheriam os frutos das nossas árvores.
 
Então, decidiu plantar no centro do jardim e bem em frente à sua casa uma pequena árvore de fruto que foi buscar ao seu pomar. Era um pessegueiro. Cuidou dele incansavelmente e com toda a ternura do mundo durante uns três anos e jamais partilhou com ninguém o projeto que tinha em mente.
 
Durante esse tempo, pesquisou, estudou e experimentou e nos meses mais adequados começou a realizar o seu audacioso e engenhoso sonho. Selecionou as árvores de fruto pretendidas e retirou-lhes os galhos que iriam unir-se aos ramos do pessegueiro do jardim através da técnica do enxerto. Optou nalguns casos pela enxertia de fenda e noutros pela enxertia de encosto.
 
O avô Joaquim sabia que para o sucesso daquelas delicadas operações devia usar garfos e ramos do porta-enxerto que tivessem o mesmo diâmetro. Uma vez juntos, a união era consolidada com ráfia natural, a extremidade do enxerto era isolada com material isolante e para isolar as feridas, utilizava cera vegetal.
 
Com uma paciência e uma sabedoria extraordinárias, o avô Joaquim esperava que a natureza fizesse a sua parte e, passados uns meses, dos ramos da árvore foram desabrochando pêssegos, damascos, ameixas, cerejas, nectarinas, azeitonas, tâmaras, abacates e mangas. Uma única árvore oferecia nove frutos diferentes e um extraordinário e diversificado colorido era oferecido a toda a gente ao longo de todo o ano.
 
A mulher do avô Joaquim estava sem palavras, bem como a filha, genro e neto. Nunca tinham visto nem ouvido falar de fenómeno semelhante mas a verdade é que todos estavam admirados e maravilhados com aquela notável obra de arte da natureza cujo escultor fora o próprio avô Joaquim. A vizinhança e gente de muito longe vinha apreciar a árvore dos nove frutos porque contado ninguém acreditava.
 
Quando o neto do avô Joaquim fez seis anos, como de costume, houve festa na casa dos avós. Como sempre, muitos foram os presentes e, como habitualmente, o avô Joaquim não dera nada ao neto. No entanto, nesse dia, o avô Joaquim tomou a palavra e disse:
 
- Bruno, nunca te dei nada… mas este ano, tenho um presente para ti. Esta árvore que cultivei e que tem muitos frutos diferentes é para ti.
 
O menino e todos os demais ficaram surpreendidos com as palavras do avô Joaquim e achavam estranho como é que uma árvore podia ser um presente de aniversário. Então, ele explicou:
 
- Se todas as pessoas do mundo plantassem uma árvore o planeta estaria salvo… Diz uma lenda chinesa que as amizades verdadeiras são como árvores de raízes profundas pois nenhuma tempestade as consegue arrancar. Não é que as raízes desta árvore sejam muito profundas mas são o suficiente para vos dizer a todos que o afeto que por vocês sinto é muito grande, mesmo que pareça que não o demonstre… uma vida sem amor é como uma árvore sem flores e sem frutos… Que esta árvore que hoje ofereço ao Bruno simbolize a vida que tem que dar frutos para que tenha sentido e represente os nove frutos do Espírito Santo.
 
Todos ficaram muito sensibilizados com as palavras do avô Joaquim, apesar de não terem percebido bem a ideia dos frutos do Espírito Santo. Então, ele explicou, enquanto retirava cuidadosamente um pêssego da árvore:
 
- Este pêssego poderia simbolizar a Caridade… ‘A caridade é paciente, a caridade é benigna, não é invejosa; a caridade não se ufana, não se ensoberbece, não é inconveniente, não procura o seu interesse, não se irrita, não suspeita mal, não se alegra com a injustiça, mas rejubila com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta’.
 
Depois, retirou um damasco e disse:
 
- Este damasco poderia simbolizar a Alegria… ‘Saber encontrar a alegria na alegria dos outros, é o segredo da felicidade’… ‘A alegria de fazer o bem é a única felicidade verdadeira’… ‘A alegria e o sofrimento são inseparáveis como compassos diferentes da mesma música’... ‘A alegria não está nas coisas, mas em nós’.
 
De seguida, puxou uma ameixa e disse:
 
- Esta ameixa poderia simbolizar a Paz… ‘A paz é a única forma de nos sentirmos realmente humanos’… ‘A paz do coração é o paraíso dos homens’… ‘Não se pode manter a paz pela força, mas sim pela concórdia’… ‘Aqueles que estão livres de pensamentos rancorosos certamente encontram a paz’.
 
Posteriormente, recolheu uma cereja e disse:
 
- Esta cereja poderia simbolizar a Paciência… ‘A paciência é a mais heroica das virtudes, justamente por não ter nenhuma aparência heroica’… ‘A paciência é a fortaleza do débil e a impaciência a debilidade do forte’... ‘Não há lugar para a sabedoria onde não há paciência’… ‘A paciência é amarga, mas seu fruto é doce’.
 
Depois, pegou numa nectarina e disse:
 
- Esta nectarina poderia simbolizar a Benignidade… ‘Não te desamparem a benignidade e a fidelidade; ata-as ao pescoço; escreve-as na tábua do teu coração e acharás graça e boa compreensão diante de Deus e dos homens’… ‘A benignidade é a essência da vida e a verdade a essência do caráter’.
 
De seguida, agarrou numa azeitona e disse:
 
- Esta azeitona poderia simbolizar a Bondade… ‘Todo o azedume, animosidade, cólera, gritaria e maledicência, se elimine do meio de vós, bem como toda a espécie de maldade. Sede bondosos, compassivos uns com os outros e perdoai-vos mutuamente, como também Deus vos perdoou em Cristo’… ‘Não devemos permitir que alguém saia da nossa presença sem se sentir melhor e mais feliz’.
 
Posteriormente, apanhou uma tâmara e disse:
 
- Esta tâmara poderia simbolizar a Fidelidade… ‘Só se pode alcançar um grande êxito quando nos mantemos fiéis a nós mesmos’... ‘A fidelidade não é uma escolha e nem um sacrifício, ela é uma verdade’… ‘É na adversidade que se prova a fidelidade’... ‘Quando se ama, a fidelidade nada custa’.
 
Depois, recolheu um abacate e disse:
 
- Este abacate poderia simbolizar a Mansidão… ‘Vinde a Mim, todo os que estais cansados e oprimidos, e aliviar-vos-ei. Tomai sobre vós o Meu jugo, e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e achareis alívio para as vossas almas, pois o Meu jugo é suave e o Meu fardo é leve’… ‘Manter a tranquilidade é conquistar a mansidão’.
 
Finalmente, agarrou numa manga e disse:
 
- Esta manga poderia simbolizar a Temperança… ‘A temperança é um dos maiores prazeres’… ‘A primeira vítima da falta de temperança é a própria liberdade’... ‘A temperança é essa moderação pela qual permanecemos senhores dos nossos prazeres em vez de escravos’.
 
Todos estavam boquiabertos com as palavras sábias do avô Joaquim e com a fé que demonstrara ao referir-se aos dons do Espírito Santo. Afinal, ele oferecera ao Bruno o mais belo presente que poderia ter dado. Dera-se a si próprio ao cultivar o seu próprio presente e ao testemunhar os seus valores e convicções para a vida do neto.
 
A avó do Bruno disse, então:
 
- Que grande e inesperada surpresa… Sempre tive uma grande devoção ao Espírito Santo e todos os dias lhe peço os seus dons para a nossa família… Este presente é extraordinário pelo que representa… Não é boa a árvore que dá maus frutos, nem má a árvore que dá bons frutos. As árvores são conhecidas pelos seus frutos… Oxalá o Bruno e nós todos tenhamos boas raízes, sejamos boa terra, deixemo-nos podar por quem nos pode ajudar verdadeiramente e demos bons frutos.
 
De seguida, o Bruno tomou a palavra e disse:
 
- Obrigado avô pelo teu presente tão original. Não vou esquecer nunca as tuas mensagens e lições. Quando comer cada um dos frutos desta árvore, vou recordar o significado que lhes deste… As pessoas são como as árvores que quando se casam dão flores e os filhos são os frutos… eu sou o fruto desta família tão querida que usou o fertilizante do amor para que eu amadurecesse e ficasse tão docinho…
 
Todos riram a bandeiras despregadas. Então, o avô Joaquim sugeriu que se fizesse uma salada com aquelas nove peças de fruta e terminou dizendo:

- Realmente… somos como uma árvore, enraizados na vida com a missão de crescer, florescer e dar bons frutos… Para colhermos bons frutos basta que cada um de nós faça o bem, sem olhar a quem. Como dizem os hindus ‘A árvore não prova a doçura dos próprios frutos, o rio não bebe suas próprias ondas, e as nuvens não despejam água sobre si mesmas: a força dos bons deve ser usada para benefício de todos’.

Paulo Costa

Conto.

O Paulo Costa é licenciado em Teologia e mestrado em Teologia Sistemática pela Faculdade de Teologia da UCP do Porto e tem uma Pós-graduação/Especialização em Educação Sexual pelo Instituto Piaget. É autor de alguns livros na área da Fé e Adolescência. É professor de EMRC no Colégio Liceal de Santa Maria de Lamas. É um bloguer.

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail