Conto: O homem que ensinou a amar

Conto 15 novembro 2020  •  Tempo de Leitura: 14

Era uma vez um homem que se chamava Jesus e era de Nazaré. Não havia ninguém que já não tivesse ouvido falar dele e toda a gente queria ir vê-lo e ouvi-lo. Diziam que era uma pessoa muito boa e que respeitava e tratava a todos como muita cordialidade e ternura. Na verdade, nunca se ouviu dizer que alguém tivesse sido desprezado ou marginalizado por si, já que a todos acolhia com carinho, como se não existisse mais ninguém no mundo inteiro.

 

Falava muitas vezes de um Deus que era Pai e, por isso, todos os seres humanos eram seus filhos e, consequentemente, irmãos e membros de uma única e mesma família. Não gostava mesmo nada de pensar que existia um Deus que quisesse para si apenas alguns e quisesse apenas salvar uns quantos. Se Ele criara com amor todos os homens e mulheres à sua imagem e semelhança, então faria tudo e mais alguma coisa para que todos, sem exceção, fossem felizes consigo e em plenitude.

 

No entanto, muitos havia que o olhavam de lado e criticavam por conversar e conviver com pessoas que eram mal vistas pela sociedade e as catalogavam de pecadoras, impuras, indignas e maldosas, por se afastarem e infringirem as muitas leis de Deus e do mundo. Contudo, Jesus não se importava e até considerava que eram precisamente esses homens e mulheres que mais precisavam da sua atenção e dedicação e não aqueles que se julgavam perfeitos, idóneos e santos.

 

Um dia, Jesus foi surpreendido pela aproximação tumultuosa de um grupo de homens que arrastavam com rudeza uma mulher que teria sido apanhada em flagrante adultério, violando, por isso, a Lei de Moisés e merecendo o castigo previsto: o apedrejamento até à morte. Aqueles, mais do que procurar saber a sua opinião, o que queriam era arranjar-lhe uma armadilha para terem motivos para o acusar e conseguirem a sua condenação junto das autoridades.

 

Jesus, serena e sabiamente, preferiu não fazer julgamentos nem responder diretamente, mas como insistiam nas suas interrogações e provocações, disse-lhes que de entre eles quem estivesse sem pecado que lhe atirasse a primeira pedra. Diante daquela insinuação, os homens foram saindo todos um a um, deixando ali no chão as pedras que tinham levado.

 

Passados alguns minutos, a mulher estava ali sozinha com Jesus e ele, olhando-a com amabilidade, disse-lhe que se ninguém a tinha apedrejado, não era ele que a ia condenar e pediu-lhe que não voltasse a pecar. A mulher nunca se sentira tão feliz em toda a sua vida pois nunca ninguém tinha olhado para si com o respeito e afeto que demonstrara Jesus. Pela primeira vez, tinha-se sentido uma pessoa e não um qualquer objeto.

 

Passados uns tempos, um homem foi ter com Jesus e perguntou-lhe qual era o primeiro e mais importante de todos os mandamentos da Lei. Calma e solenemente, respondeu que havia dois muito relevantes e que estavam intimamente unidos. O primeiro consistia em amar o Senhor Deus com todo o coração, alma, entendimento e forças e o segundo em amar o próximo com a si mesmo. Não havia mandamentos maiores que esses.

 

O homem concordou com a resposta de Jesus, dizendo com firmeza e clarividência que aquelas duas vertentes do amor autêntico e sem medida ao Senhor e aos outros tinha mais valor que todos os holocaustos e sacrifícios e resumiam perfeitamente o essencial da Lei. Então, Jesus, reconhecendo a sinceridade do seu coração, disse-lhe que ele não estava longe do Reino de Deus.

 

Durante muito tempo não se falou de outra coisa em toda a região e eram cada vez mais as pessoas que se acercavam de Jesus para que as escutasse e aconselhasse nos seus dramas do dia-a-dia e as curasse das suas maleitas físicas ou psíquicas. Além de contar lindas histórias, cheias de profundas e inquietantes mensagens para a vida concreta, Jesus falava insistentemente do Reino dos Céus e do amor como único caminho para lá chegar. De nada valia cumprir, escrupulosa e exteriormente, a letra das leis sagradas se não se era capaz de amar as pessoas do fundo do coração.

 

Passadas umas semanas, Jesus estava junto a um lago a descansar com alguns amigos. Como algumas pessoas se aperceberam que ele estava ali, a notícia espalhou-se rapidamente pelas redondezas e depressa se juntou naquele sítio uma multidão sedenta de ouvi-lo falar do amor.

 

Então, Jesus levantou-se e, após ter olhado por uns instantes para o céu, sorriu para toda a gente e disse-lhes que assim como o Pai lhe tinha amor, assim ele os amava muito e pediu que permanecessem no seu amor. Se guardassem os seus mandamentos, permaneceriam no seu amor, assim como ele, que guardava os mandamentos do Pai, também permanecia no seu amor. 

 

De seguida, disse que o seu mandamento era que se amassem uns aos outros como ele os tinha amado. Ninguém tinha mais amor do que aquele que era capaz de dar a vida pelos seus amigos e eles eram seus amigos, se fizessem o que ele dizia. Não os chamava de servos, pois o servo não estava ao corrente do que fazia o seu senhor, mas chamava-os de amigos porque lhes dava a conhecer tudo o que ouvira de seu Pai.

 

Depois, acrescentou que não tinham sido eles a escolhê-lo, mas que fora ele a escolhê-los e os destinou a irem e a darem fruto. Tudo o que pedissem ao Pai em seu nome, Ele o concederia. Era fundamental que se amassem uns aos outros pois somente assim toda a gente saberia e reconheceriam que eles eram verdadeiramente seus discípulos.

 

Toda a gente ia encantada e deliciada com as palavras de Jesus e conversavam longamente sobre o poder do amor para a renovação e transformação do mundo. Muitas eram as discussões que se desencadeavam porque se para alguns aquilo era uma completa utopia, para outros era a única forma de mudar alguma coisa, já que havia muita hipocrisia, egoísmo e maldade no coração das pessoas.

 

Passados uns meses, uma mulher aproximou-se de Jesus e, referindo-se à extrema dificuldade em amar ao Senhor com todo o coração, com toda a alma, com todo o entendimento e com todas as forças e em amar ao próximo como a si mesmo e como ele amava, recordou as leis do ‘olho por olho e dente por dente’ e do ‘amar o próximo e odiar os inimigos’.

 

Então, Jesus, vendo que, entretanto, se tinham juntado muitas pessoas, aproveitou para afirmar que não se podia amar com palavras, mas apenas com obras e com verdade. E disse que era inconcebível que alguém que possuísse bens e visse o seu irmão com necessidades lhe fechasse o seu coração. A verdade é que o amor de Deus não poderia permanecer nesta pessoa. Depois, disse que se alguém dissesse que amava a Deus, mas odiasse outra pessoa, era um mentiroso. De facto, aquele que não amava o seu irmão, a quem via, não podia amar a Deus, a quem não via. Quem amava a Deus, devia amar também o seu irmão.

 

Como todos bateram palmas, Jesus sorriu e, pedindo que parassem, disse que o mais difícil nem era isso. Diante da lei de Talião que afirmava o ‘olho por olho e dente por dente’, disse que se alguém lhes batesse na face direita, deveriam, se fosse preciso, oferecer também a esquerda, pois responder na mesma moeda só geraria mais ódio e mais guerra e apenas o diálogo e o perdão resolviam verdadeiramente os problemas da vida.

 

A propósito da lei ‘do amor ao próximo e do ódio ao inimigo’, Jesus desafiou-os a fazer de outra maneira: amar os inimigos e orar pelos que os perseguiam. Na verdade, se amassem apenas os que os amavam, que recompensa haveriam de ter e o que é que havia ali de extraordinário? Afinal, não era isso que faziam os que eram considerados maus? Deus fazia com que o sol se levantasse sobre os bons e sobre os maus e fazia cair a chuva sobre os justos e sobre os pecadores. E, lembrando que eles amavam porque tinham sido primeiramente amados por ele, convidou a todos a serem perfeitos como era perfeito o Pai celeste.

 

Como tudo quanto Jesus dizia e defendia não deixava ninguém indiferente e era motivo de conversa entre as pessoas, a sua vida começou a correr perigo, já que as autoridades religiosas e políticas se sentiam incomodadas com a sinceridade e pertinência das suas palavras e com o impacto dos seus atos junto da multidão. Dizer que era o Filho de Deus e apresentar o Reino dos Céus perturbava os judeus e os romanos.

 

Apesar de jamais ter feito ou dito alguma coisa má, Jesus foi condenado à morte. Como não queria esconder-se, negar ou fugir das realidades em que acreditava, deixou que o prendessem e crucificassem, oferecendo a sua vida por amor à humanidade. Como dizia tantas vezes, não havia maior prova de amor do que dar a vida pelos amigos. O seu sangue derramado foi o preço da vida e da salvação de todos os seres humanos e na cruz ainda pediu ao Pai que perdoasse aquela gente que o matava pois não saberiam nem teriam consciência do que estavam a fazer.

 

Após a ressurreição de Jesus, os seus seguidores perceberam que o amor de Deus se manifestara da forma mais bonita e sublime que poderia existir, pois decidira enviar ao mundo o seu Filho Unigénito, para que, por ele, tivessem a verdadeira vida e descobrissem o poder do seu projeto.

 

Os primeiros cristãos perceberam que a palavra que melhor definia a Deus era ‘Amor’, e compreenderam que quem permanecesse no amor permanecia em Deus e Deus nele. Amar não era uma coisa teórica e abstrata, mas dar a vida e partilhar o que se tinha e era.

 

E toda a gente elogiava os seguidores de Jesus e reconheciam-nos pela forma como se amavam uns aos outros como ele pedira. Eles davam-se gratuita e desinteressadamente por amor e estavam convencidos de que havia mais felicidade em dar do que em receber e que o amor estava mais em fazer tudo para que os demais fossem felizes.

 

Então, um homem que se convertera ao cristianismo chamado Paulo decidiu passar o resto dos seus dias a anunciar o Amor de que Jesus falava. Dizia a toda a gente que, mesmo que falasse as línguas dos homens e dos anjos, se não tivesse amor, era como um bronze que soava ou um címbalo que retenia. Ainda que tivesse o dom da profecia e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, ainda que tivesse tão grande fé que fizesse transportar montanhas,se não tivesse amor, nada era. Ainda que distribuísse todos os seus bens e entregasse o seu corpo para ser queimado, se não tivesse amor, de nada lhe aproveitaria.

 

Afirmava muitas vezes que o amor era paciente e prestável, não era invejoso, nem arrogante, nem orgulhoso. O amor nada fazia de inconveniente, não procurava o seu próprio interesse, não se irritava nem guardava ressentimento. Não se alegrava com a injustiça, mas rejubilava com a verdade. O amor tudo desculpava, tudo cria,tudo esperava, tudo suportava.

 

E dizia, com toda a convicção, que o Amor jamais passaria. As profecias teriam o seu fim, o dom das línguas terminaria e a ciência iria ser inútil, já que o nosso conhecimento era imperfeito e também imperfeita era a nossa profecia. Mas, quando viesse o que era perfeito, o que era imperfeito desapareceria. E declarou solenemente e com um sorriso no rosto que permaneceriam para sempre três coisas muito importantes: a fé, a esperança e o amor. Mas a maior de todas era o amor.

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