Que faz Deus numa cruz?

Estamos na Semana Maior do Cristianismo. Semana em que somos convidados a meditar e, sobretudo, a viver intensamente esta entrega definitiva de Jesus na cruz. São Paulo dirá mais tarde, que um "Deus crucificado" será motivo de escândalo para os pagãos. E não será para tandos de nós, cristãos?

 

José Antonio Pagola, faz uma reflexão excelente sobre o mistério deste Deus crucificado pelos homens. Dela retirei o título desta crónica. «As perguntas são inevitáveis: Como é possível acreditar num Deus crucificado pelos homens? Temos consciência do que estamos a dizer? Que faz Deus numa cruz? Como pode subsistir uma religião fundada numa conceção tão absurda de Deus?»

 

De facto, o conceito de Deus para o ser humano "exige" a omnipotência e a majestade, a imutabilidade e a felicidade. Em Jesus, Deus aparece como impotente e humilhado, que sofre connosco a dor, a angústia e a morte. É, portanto, um Deus de uma humanidade incrível. No Tríduo Pascal, que brevemente celebraremos, comtemplaremos um Deus que dá sentido à nossa fé, porque abraça a nossa realidade, que tantas vezes é preenchida pelo sofrimento. Jesus não era um inconsciente, nem tão pouco um louco. Ele sabia que continuando com o seu ministério, os seus adversários iriam dar-lhe a morte. Mas o bem tinha que ser feito e a sua mensagem anunciada até ao fim.

 

Bem e mensagem, que se "sintetizam" na Quinta Feira Santa. Neste dia, celebramos a Instituição da Eucaristia, e também, o serviço, a diaconia. O Papa Francisco, a este propósito, disse-nos o ano passado: «Jesus (na última ceia) ofereceu ao Pai o seu corpo e o seu sangue nas espécies do pão e do vinho e, dando-as como alimento aos apóstolos, ordenou-lhes que perpetuassem esta oferta em sua memória. O evangelho desta celebração, recordando o Lava-Pés, exprime o mesmo significado da Eucaristia numa outra perspetiva.»

 

O sofrimento fechado sobre si mesmo não tem sentido. Direi que é masoquismo. Este Deus crucificado exprime o seu verdadeiro significado. Jesus sofreu por amor. Neste sentido, continua a sofrer com aquele que sofre. O fracasso humano de Jesus, na sua intenção de instaurar o Reino de Deus, convida-nos a refletir sobre o verdadeiro sentido das limitações humanas. Como diz Pagola, «Se o nosso primeiro objetivo é evitar a dor a todo o custo e procurar o máximo de prazer possível, nunca poderemos aceitar a pregação de Jesus». A sua morte foi a consequência da sua vida, da sua pregação e das suas atitudes. Lendo o Mistério da Paixão nos evangelhos, aquilo que deixa-me boquiaberto é a liberdade com que Jesus, no seu aniquilamento, vive este momento de sofrimento e solidão intensos, continuando fiel a si mesmo e à sua missão salvífica entre os homens.

 

Provocar a nossa conversão livre e colocar-nos no serviço ao próximo, é o que Deus  quer fazer... numa cruz...
 
Uma Semana Santa e uma Verdadeira Páscoa.

Paulo Victória

Cronista

Licenciado em Teologia. Professor de EMRC. Adora fazer Voluntariado.

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