Conto: O pirilampo do pântano

Conto 16 novembro 2019  •  Tempo de Leitura: 5

Era uma vez um jovem pirilampo que vivia nas margens de um pântano. Como todos os seus familiares e amigos, a emissão de luz fosforescente tornava-o um inseto muito especial e original, sobretudo nos meses mais quentes, onde as luzinhas a piscar entre as árvores e arbustos, acompanhadas pelas estrelas cintilantes do céu, ofereciam um espetáculo único a toda a floresta, qual festa psicadélica na escuridão das noites.

 

O pirilampo tinha aprendido desde jovem que a luz que os pirilampos esplendorosamente ostentavam e exibiam devia-se a um singular processo biológico e que tinham essencialmente uma importante função de defesa em relação aos predadores e se constituíam como um ímpar instrumento de sedução.

 

No entanto, o jovem pirilampo não se sentia feliz nem realizado. Não queria ter nascido pirilampo e estava sempre a comparar-se com os demais animais da floresta. Resmungava com o seu pequeno tamanho diante da imponência dos elefantes, hipopótamos, girafas, leões e crocodilos e achava ridículos os seus dois centímetros. Lamentava-se, também, que tivesse dois minúsculos e frágeis pares de asas e que voasse tão lentamente e a tão baixa altitude em comparação com as águias, milhafres, falcões, andorinhas e melros. Queixava-se, ainda, de não pertencer a uma espécie bonita pois não apreciava as formas nem as tonalidades acastanhadas do seu corpo e invejava a formosura dos tigres, zebras, pavões, papagaios e borboletas.

 

Um dia, houve uma enorme tempestade que se estendeu por vários dias seguidos. As chuvas fizeram trasbordar as águas dos rios e do pântano e encharcaram toda a floresta. Com as agruras do temporal, os animais deixaram de ter alimento para saciar a sua fome e os ventos deitaram abaixo inúmeras árvores, dificultando decisivamente a sua mobilidade habitual.

 

A intensidade da pluviosidade e do vendaval era tamanha que a visibilidade se tornou quase impossível, como se um denso nevoeiro ou a escuridão da noite tivesse coberto toda a floresta permanentemente. Todos os animais da floresta ficaram apavorados e tropeçavam frequentemente nas árvores e uns nos outros a esgueirar-se de um lado para o outro.

 

Todos não. Apenas o jovem pirilampo parecia manter alguma serenidade diante daquele caos da natureza. Dentro do buraco de uma velha árvore junto ao pântano, o pirilampo esforçava-se por observar o que estava a acontecer, e, em vez de lamentar as trevas, pensava o que fazer para ajudar os amigos a resistir e lutar contra a tempestade que assolava a floresta.

 

A família do pirilampo chamava-o angustiadamente para que fugisse dali como todos os outros animais pois parecia que a morte era mais que certa se ali permanecesse, mas ele dizia que não podia nem queria abandonar a sua terra de sempre sem tentar fazer algo de útil.

 

Os pais do pirilampo lembraram-lhe que ele sempre admirara a força e o tamanho dos grandes animais da floresta e que até esses já se tinham escapulido dali há muito sem que tivessem ajudado a arrastar as árvores caídas. Os tios recordaram que as aves, que ele tanto invejava por voarem alto e velozmente, podiam ter ajudado a avisar a aproximação da tempestade ou a orientar os demais animais e também eles já se tinham sumido. E os avós disseram-lhe que de nada serviu a beleza dos animais que ele apreciava pois também eles tinham desaparecido egoisticamente e sem deixar rasto.

 

O pirilampo deu-lhes toda a razão, mas disse-lhes que ele tinha que fazer alguma coisa pela floresta e pelos seus habitantes e pediu encarecidamente para que se juntassem todos de forma a que a intensidade da luz que naturalmente emitiam fosse maior e fosse vista por toda a fauna. Assim, quando as chuvas pararam, o jovem pirilampo liderou um grupo de muitos pirilampos e no meio da penumbra foram por toda a floresta chamar todos animais.

 

Uma extensa fila formada por toda a bicharada da floresta seguiu o jovem pirilampo e sua equipa em direção à zona do pântano onde todos viviam e durante vários dias capitaneou sábia e heroicamente os trabalhos de reconstrução dos habitats. Todos os animais reconheceram e agradeceram a inteligência, sagacidade e capacidade de liderança do pequeno jovem pirilampo que salvara a floresta e ele, orgulhoso, nunca mais voltou a desejar ser outra coisa qualquer.

Paulo Costa

Conto

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