Conto: «A BALEIA DO PESCADOR»

Conto 16 abril 2018  •  Tempo de Leitura: 5

Era uma vez um pescador que todos os dias se fazia ao mar no seu barco para pescar. Se havia coisa que lhe dava satisfação era ir na sua pequena embarcação, depois de um árduo dia de trabalho, mar dentro rumo ao pôr-do-sol e lançar a sua cana a ver se algum peixe picava.


Gostava imenso de estar sozinho uma ou duas horas por dia ao entardecer a contemplar silenciosamente as ondas, as nuvens e as gaivotas, enquanto estava na pescaria e, muitas vezes, mergulhava nas águas e isso sabia-lhe pela vida.


Um dia, sentiu a ondulação mais agitada e, olhando ao largo, ficou boquiaberto ao ver um grupo de baleias que passeavam e saltavam na água. O seu coração estremeceu num misto de emoção e medo. Nunca vira cetáceos tão perto de si e sentia-se maravilhado com a sua imponência, graciosidade e agilidade e, ao mesmo tempo, temia pela sua vida, pois facilmente o poderiam atacar. Dava graças a Deus por tão singular privilégio de estar tão próximo do maior animal do planeta e, simultaneamente, pedia-lhe que o livrasse de qualquer mal.


A olho nu parecia-lhe que eram umas nove ou dez baleias e as maiores poderiam ter uns vinte e tal metros de cumprimento e mais de sessenta toneladas. Eram de coloração cinza e a parte inferior era esbranquiçada. Quando as baleias atingiam a superfície, as barbatanas dorsais eram bem visíveis logo após o focinho pontudo e sopravam algumas vezes pelos espiráculos, lançando esguichos de água por uns bons dez metros de altura. Permaneciam em cada visita à tona da água mais de um minuto e, depois de mergulharem profundamente no mar durante uma dezena de minutos, saltavam outra vez completamente para fora da água.


O homem estava arrebatado e embevecido com aquele surpreendente espetáculo e estava a gostar particularmente das suas inusitadas vocalizações pois parecia que estavam a conversar umas com as outras e até a cantar num autêntico concerto.


O problema foi quando se apercebeu que, paulatinamente, as baleias estavam mais próximas de si e os saltos colossais que davam provocavam ondas que faziam oscilar cada vez mais o seu pequeno e frágil barco. Estava apavorado e, após tentar afugentar uma baleia que se abeirou demais, o inevitável aconteceu. O barco virou inapelavelmente e o homem teve que lutar pela vida, esforçando-se infatigavelmente por se manter à superfície agarrado a um pedaço de madeira da embarcação que, entretanto, se afundara.
Depois de muitos Pai-Nossos e muitas Ave-Marias e quando parecia que a morte era mais que certa, o homem deu-se conta que, para mal dos seus pecados, uma baleia estava muito perto de si e, após andar à sua volta por uns momentos, começou a tocar-lhe com o seu enorme focinho estreito e comprido.


Admiravelmente, a baleia incitava o homem a nadar e empurrava-o suavemente na direção da praia. Em pouco mais de meia hora, o homem estava no areal são e salvo. Não podia crer no que acabava de experienciar naquele final de tarde e tudo lhe parecia surreal. Apesar de todos terem ficado preocupados com o homem e lamentarem a perda do barco, ninguém acreditava na história das baleias que contara, até porque não era habitual andarem por aquelas bandas.


A verdade é que o homem construiu um barco de madeira maior e mais robusto para continuar a ir à pesca e poder continuar a observar os cetáceos quando andassem por ali. Todos os anos esperava ansiosamente a chegada da época das baleias passearem ao largo da costa pois migravam sazonalmente de oceano para oceano à procura de alimento e podia ser que tivessem escolhido aquela rota. Ia cada vez mais tempo para o mar e, enquanto esperava que a sua cana de pesca lhe trouxesse algum peixe, observava as baleias com uns binóculos, admirava as suas danças e deliciava-se com as suas melodias.
Inacreditavelmente, todos os anos a baleia que salvara o homem aproximava-se uma ou duas vezes do seu barco com todo o cuidado como que para cumprimentar o velho amigo e deixava que ele a acariciasse durante uns minutos. O homem sentia-se como se fosse o Jonas dos tempos modernos e acreditava firmemente que as baleias gostavam de si e iam àquela praia todos os anos só para o visitar. E sentia-se o pescador mais feliz do mundo.

Paulo Costa

Conto

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