Uma vela vacilante

Razões para Acreditar 16 março 2019  •  Tempo de Leitura: 2

«Quando Deus soprou sobre a minha lama para a infundir na minha alma, decerto soprou demasiado forte. Nunca me recuperei deste sopro de Deus. Nunca cessei de tremer como uma vela vacilante entre os dois mundos.»

 

Uma vela avança numa procissão, enquanto que a chama é sacudida pelo vento, até ao risco de extinguir-se. É uma imagem simples que se torna uma parávola da vida. Mas o pensamento é aprofundado no texto que citámos, e que é fruto da meditação de uma poetisa espiritual francesa, Marie Noël (1883-1968).

 

Ela recorre ao passo do Génesis no qual se recorda que o homem se torna, a partir da matéria inerte, criatura viva através do sopro do Espírito divino. Esse hálito não traz só a vida, mas também a consciência, a espiritualidade, o amor.

 

Marie sente dentro de si aquele sopro e perceciona-o como um vento impetuoso que a arrasta para o divino, ainda que estando solidamente ancorada ao presente e ao terreno. Por isso fala de «dois mundos» entre os quais vacila, como a vela exposta aos ventos.

 

Tem-se, assim, a representação de toda a experiência espiritual, que é muitas vezes tensão entre aquilo que somos e aquilo que devemos ser, entre matéria e espírito, entre mal e bem, entre vício e virtude.

 

O frémito do sopro divino em muitos, infelizmente, é quase nulo. O peso da exterioridade embota a respiração da alma. No entanto, em todo o coração nunca se extingue completamente a vibração daquele Espírito.

 

É por isso que é preciso acreditar sempre no renascimento, na ressurreição, na vida que volta a pulsar, tremeleando como uma vela vacilante.

 

[P. (Card.) Gianfranco Ravasi | In Avvenire]

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