Sonhar: perda de tempo ou semente de futuro?

Razões para Acreditar 25 agosto 2018  •  Tempo de Leitura: 4

Quando de alguém se quer dizer que tem falta de bom senso, ou até de senso comum, diz-se muitas vezes que é «um sonhador». Porque o sonhador não tem os pés na terra, não faz ideia do que é a concretude, não tem consciência da oportunidade, não é capaz (ou talvez não queira) de ser esperto. É uma condição típica dos jovens, aos quais se repete até à náusea «quando parares de sonhar, então, finalmente, conseguirás…». Desta forma, o sonho acaba por ter a sua dignidade exclusivamente como atividade onírica noturna, enquanto que sonhar de dia não é mais do que uma perda de tempo.

 

Uma perda de tempo. Mas para quem? E a respeito de quê? Para o papa Francisco não restam muitas dúvidas, e disse-o claramente ao encontrar-se, no passado sábado e domingo, mais de 70 mil jovens italianos, num evento convocado com vista ao sínodo dos bispos de outubro, porque, declarou, os sonhos dos jovens «fazem um pouco de medo aos adultos. Talvez porque tenham cessado de sonhar e de arriscar, talvez porque os sonhos [dos jovens] coloquem em crise as suas [dos adultos] opções de vida».

 

E sim, os sonhos dos jovens colocam em crise as certezas improvisadas, um pouco covardes, de quem lançou fora os remos do barco. «Mas vós, não deixeis roubar os vossos sonhos», porque «um jovem que não sabe sonhar é um jovem anestesiado», ao passo que, pior ainda, são «os jovens de sofá», ou aqueles «sem sonhos que vão para a reforma aos 20-22 anos», afirmou o papa.

 

Na vigília de oração com os jovens italianos ocorrida a 1 de setembro de 2007, em Loreto, o papa Bento XVI lançou uma mensagem análoga: «Deixai que esta tarde eu vos repita: cada um de vós, se permanecer unido a Cristo, pode realizar coisas grandiosas. Eis por que, queridos amigos, não deveis ter medo de sonhar de olhos abertos grandes projetos de bem e não vos deveis desencorajar pelas dificuldades».

 

«Cristo tem confiança em vós e deseja que possais realizar cada um dos vossos projectos mais nobres e altos de felicidade autêntica. Nada é impossível para quem confia em Deus e se entrega a Ele. Olhai para a jovem Maria! O Anjo perspectivou-lhe algo verdadeiramente inconcebível: participar do modo mais envolvente possível no maior dos planos de Deus, a salvação da humanidade», apontou o papa emérito.

 

Também Francisco quis propor aos seus interlocutores o exemplo de um rapaz que «sonhava em grande» e não tinha medo de o fazer: «Havia um rapaz, aqui em Itália, que começou a sonhar em grande, e o seu pai, um grande homem de negócios, procurou contrariá-lo, mas ele disse: “Não, eu quero sonhar isto que sinto dentro de mim”; e no fim foi-se embora para sonhar».

 

Vendo-se seguido pelo pai, «esse jovem refugiou-se no bispado, despojou-se das vestes e deu-as ao pai: “Deixai-me ir pelo meu caminho”». Esse rapaz «chamava-se Francisco e mudou a história da Itália».

 

Para o papa, o santo de Assis «arriscou, sonhando em grande, não conhecia as fronteiras». «Era um jovem como vós, e como sonhava!» Sonhos grandes, belos, e para os ver não precisava de artifícios nem de drogas que «te adormecem o coração, te queimam os neurónios, te arruínam a vida». Sonhos que têm todo o direito de cidadania e que, portanto, não só não merecem ser mortificados, mas que “o mundo dos grandes” devia sempre encorajar, impelindo os jovens a cultivá-los como uma flor preciosa. Talvez não deem riqueza alguma, mas acrescentarão beleza ao mundo.

 

[Salvatore Mazza | In Avvenire]

tags: Snpc, Sonho

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