O tempo que não temos

Razões para Acreditar 22 abril 2018  •  Tempo de Leitura: 3

Não há tempo. É a doença dos tempos modernos, a falta de tempo. Às vezes parece que não tenho tempo para dormir: vou só ali dormir como quem vai ao supermercado e já vem. É assim vezes de mais. E eu não gosto nada de ir dormir porque nunca quero ir-me embora do mundo. Uma parvoíce, eu sei. O meu avô dormia sempre depois do almoço: sentava-se na poltrona da sala e dormia 15 minutos e a minha avó ficava à espera para sair que ele acabasse de dormir e depois lá iam. Quinze minutos, no fundo, não é tempo nenhum. E ele precisava deles para enfrentar o resto do tempo que o dia ainda tinha. Naquela altura havia tempo. Mas não é falta de tempo aquilo que hoje temos, a doença dos tempos modernos é o desperdício de tempo: o nosso tempo gasta-se, perde-se, não rende. Nós tratamos o tempo como se ele fosse ilimitado, sem aproveitar cada minuto, deixamo-lo passar sem apanhar boleia. Um dos meus filhos quando chega do futebol vem ligado a uma corrente de adrenalina e não se cala. São 15 a 20 minutos a ouvi-lo. É sempre assim: interrompo uma das minhas séries que me dão a sensação de não estar a perder tempo e fico a ouvi-lo a contar histórias, a descrever estados de alma e a pensar alto sobre os projetos que tem como futuro presidente do Sporting. Vinte minutos é pouco tempo para tanta coisa que ganhamos os dois ali. Quando revejo o meu dia, aqueles minutos devem ser dos poucos que não perdi.

Não há mãe que não diga que não tempo para estar com os filhos. É o fado das mães: ter tempo para ser mãe. Parece uma coisa parva, porque uma pessoa é mãe não está mãe. Mas o problema do tempo é o que se faz com ele, não é ele ser muito ou pouco porque nós nunca sabemos quando ele vai acabar. O que nós gostávamos mesmo era de ter tempo para tudo, assim como gostávamos de ter dinheiro para comprar tudo. Mas depois, se nos dessem, ficávamos no sofá à espera de que ele passasse. Já viram a quantidade de tempo que se esbanja? Ou não havia programas de televisão miseráveis nem o Facebook seria uma empresa colossal. Antes a pesca. É que na pesca - aquela em que as pessoas ficam horas a ver se um fio se mexe e quando isso acontece pesca-se uma alga - o cérebro não para; coisa diferente é quando o cérebro se depara com um reality show, bloqueia. Não há nada mais luxuoso do que o tempo. O tempo devia ser tratado como uma perda preciosa ou, melhor ainda, porque é muito melhor. É que o tempo não é tempo: é a vida a passar. São horas e minutos de vida. Devíamos dizer assim as horas: em minutos e segundos de vida. Para aproveitarmos melhor, raios.

 

Inês Teotónio Pereira]

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