Livro da semana: «O vento sopra onde quer»

Livros 7 fevereiro 2018  •  Tempo de Leitura: 6

Maria Virgínia Cunha enquanto voluntária em Serviços de Cuidados Paliativos apresenta-nos, neste livro, uma série de experiências de “pessoas com doenças graves e/ou avançadas e irreversíveis” que ela vivenciou como elemento de uma vasta equipa interdisciplinar, cuja finalidade é proporcionar aos doentes “qualidade de vida” e “dignidade”.

 

Estas pessoas são cada vez mais discriminados e ignorados pela sociedade “que entende ver a não-cura, a finitude e os limites impostos pela nossa mortalidade, não como um facto ineludível da própria vida, mas antes como uma derrota, um aspeto menor, sobre o qual é melhor não falar”, como realça no prefácio Isabel Galriça Neto.

 

A autora apresenta-se como católica convicta, recorrendo também, muitas vezes, a textos bíblicos do Antigo e Novo Testamento para manifestar a presença bondosa de Deus que, por ação do Espírito Santo, vai transformando, nesses doentes, as experiências interiores de desânimo, revolta, zanga, solidão e a não-aceitação da morte iminente em manifestações de confiança e entrega.

 

Esta transformação está interligada com a presença constante dos elementos da equipa que pela escuta atenta, conforto dos doentes, preparam e criam um ambiente de afeto, amizade e confiança tão necessário para a aceitação do momento que vivem. A autora insiste na necessidade de estar, conter, fazer festa, tentar integrar a família em todas circunstâncias, realçando a importância do afeto, neste processo de acompanhamento.

 

Recorre, por vezes, a autores cujos textos ou poesias retratam a situação dos pacientes que acompanha, como é realçado através de um excerto do livro “As terças com Morrie” de Mitch Albom, em que fala sobre a importância da família:

 

“Se não tiveres amor, os cuidados e a preocupação que tens de uma família, não tens grande coisa. O amor é tão supremamente importante […] – se vivesses sozinho… com esta doença lenta… seria tão mais duro. Não tenho a certeza de que conseguisse aguentar… Haviam de me visitar, amigos, associados, mas nunca seria a mesma coisa do que ter alguém, de olho em ti, atento a toda a hora. Isto é parte do que representa a família, não apenas amor, mas dar a saber aos outros que existe alguém que toma conta deles… é a segurança espiritual.”

 

Nas nove situações que descreve, a autora reconhece que estes doentes terminais, mesmo esperando a morte, vivem os últimos momentos da sua vida com dignidade, serenidade, e paz para o encontro final com Deus.

 

Para melhor percebermos o caminho percorrido Maria Virgínia Cunha, enquanto voluntária, faz uma extraordinária partilha quando fala da sua experiência com a Maria (um dos casos apresentados):

 

“A Maria partiu. Partiu um tanto de mim com ela. Passou pela raiva, a zanga... mas no seu percurso, venceu a aceitação. Morreu tranquila, como quem parte para uma longa viagem, para porto seguro. Ao longo destes três meses que a acompanhei, dei o meu silêncio contido, atento, disponível. E do fundo do seu ser jorraram as zangas, as angústias, as dúvidas, mas aos poucos foram surgindo os bons momentos, que recordava com prazer. Foi uma caminhada para a paz, como quem sobe a montanha e abre os braços para agarrar a vida.

 

A Maria não conseguiu agarrar a vida na Terra, mas sinto que a vai agarrar na Luz que a espera.”

 

Índice:

Prefácio | Introdução - Os porquês? | A equipa em Cuidados Paliativos | Estar, ouvir, conter | Fazer a festa | Família | Morte: momento final do caminhar na Terra | Percursos: João; Isabel; Maria; Joaquina; Teresa; Clara; Joana; Marta; António | E se Ivan Ilitch tivesse estado numa Unidade de Cuidados Paliativos? | Agradecimentos | Fontes / Bibliografia.

 

Informação disponível sobre o autor à data da edição desta obra:

MARIA VIRGíNIA CUNHA nasceu em Lisboa. Licenciou-se em Filologia Germânica na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, em 1961. Exerceu a docência e a Formação de Professores no Ensino Secundário. Fez parte do Conselho Diretivo, durante quatro mandatos, como responsável pela área pedagógico-disciplinar e esteve ligada à implementação de Cursos de Educação/Formação, com vista à empregabilidade de alunos com percursos educativos irregulares. Colaborou, como formadora, no Centro de Formação da Associação de Escolas «Calvet Magalhães», sediado na Escola Secundária Marquês de Pombal. Representou o Ministério da Educação em projetos de formação de três anos letivos, tendo em vista o acompanhamento de jovens com comportamentos disruptivos, e de parceria, no estrangeiro, com o envolvimento de professores e alunos do Centro de Formação Avançada Comenius, de diversas áreas, mas com especial incidência no desenvolvimento sustentável, trabalhando as realidades de cada país envolvido - Portugal, Itália e Holanda. A partir de 2000, tem desenvolvido atividade no Voluntariado, em âmbito de cariz social e, nos últimos oito anos, nos Cuidados Paliativos.

 

Público-alvo: Jovem/Adulto

 

Ficha técnica:

Título – O vento sopra onde quer – Encontros em Cuidados Paliativos | Prefácio – Isabel Galriça Neto| Autor – Maria Virgínia Cunha| Editor – Paulinas Editora, 1 ed. Out. 2015, 88 págs. | Coleção – Cuidar & Curar | ISBN: 978-989-673-484-8.

Agostinho Faria

Redator Livros

Licenciado em Comunicação Social e Cultural. Pós-graduado em Ciências da Informação e da Documentação. A viajar no surpreendente mundo novo das Paulinas Multimédia Lisboa.

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