Vocacionados

Liturgia 22 abril 2018  •  Tempo de Leitura: 3

«Quando alguém nasce, nasce selvagem» diz o refrão da antiga canção dos Delfins, evocando o mito do bom selvagem divulgado pelos ideais românticos do filósofo francês Jean-Jacques Rousseau. Por mais bonita que seja a melodia e a ideologia subjacente, ela não diz tudo sobre o que somos. Não, não somos assim tão selvagens mesmo quando nascemos. Estamos claramente pré-determinados por um código genético, agimos em conformidade com as disposições inatas e aspiramos naturalmente pela realização de um projeto que, de certo modo, está já gravado em nós. A vocação existe. Não somos fruto do acaso. Não fomos uma caixa vazia que foi sendo preenchida com o tempo.

 

Nesta semana destinada à oração pelas vocações somos interpelados a repensar as vocações no seio da Igreja. Trata-se, em suma, de descobrir o projeto de Deus em nós: porque é que eu existo? Qual é o meu papel neste mundo? Que devo fazer? Como devo agir para que a minha existência não seja um somatório de dias mas sim uma história com sentido?

 

A descoberta da vocação nem sempre é um processo fácil. Diga-se de passagem que o mais fácil é confundir a vocação com o desejo de corresponder às expetativas de uma sociedade que sobrevaloriza o que se ganha ao fim do mês e os galões que se capitalizam. O homem é mais do que um ordenado. É muito mais do que o que os outros dizem que ele é. A paternidade e a maternidade responsável, por exemplo, são um dom de Deus, um tesouro de inqualificável valor, uma vocação divina que deve ser assumida como prioridade. A não assunção desta vocação tem efeitos perversos não apenas na Igreja mas na sociedade em geral. Talvez no fim dos tempos, o Senhor da vida nos interrogue se fomos honestos com a vocação que recebemos. Atendamos às palavras do Papa Francisco a este respeito: torna-se necessário escutar, discernir e viver. Três passos fundamentais para que a vocação seja uma realidade e o homem encontre o caminho da sua autorrealização.

 

A Igreja como sujeito coletivo tem uma clara vocação divina. É chamada a ser a voz resistente, como aquela que clamava no deserto, desafiando os seus conterrâneos a não confundirem um slogan publicitário com a Boa Notícia, Deus existe, Ele está vivo, nós somos testemunhas destes factos. A Igreja é chamada a ser a realização do sonho de Deus para cada homem. Se ela, nas suas mais diversas expressões, se encolhe e se cala, se amolece ou perder vigor, quem ficará no seu lugar? Vale a pena pensar nisto.

 

Rezemos pelas vocações.

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail