Distorção Afetiva

Liturgia 27 janeiro 2018  •  Tempo de Leitura: 4

«Ao estilo chinês» - assim classificou o jornalista da BBC depois da descrição trágico-cómica de alguns métodos de combate à infidelidade conjugal que têm sido postos em prática, em grande parte, por mulheres mais velhas. Trata-se de uma questão fundamental: como salvar o matrimónio? «Lute pelo seu marido», literalmente, e «livre-se da intromissão da amante», sugerem as propostas. A verdade é que as mulheres chinesas têm uma tarefa difícil num país tradicionalmente marcado pelo costume que parece dar legitimidade aos homens mais abastados de ter um «complemento matrimonial», uma concubina. Este costume foi combatido durante o regime comunista, mas está de novo em florescimento entre uma nova elite económica, e tanto quanto parece, sem escrúpulos. Existe já o Hospital do Amor, uma empresa formada por detetives e “especialistas” contratados para identificar, denunciar e reparar as relações matrimoniais em crise. «Há 33 formas de expulsar uma amante» diz o entrevistado, «a amante é como um tumor que tem de ser removido» (cf. Crossing continents, 27/12/17).


O exemplo chinês é apenas um sintoma que evidencia o desvario afetivo da atualidade. Esta semana o jornal britânico Financial Times divulgou a reportagem do degradante jantar de caridade promovido pelo «clube dos presidentes» na elegante e civilizada Londres. A falta de pudor dos senhores deste mundo… dão esmola, e em simultâneo, humilham quem os serve. E do outro lado do mundo continua a campanha, iniciada em setembro, «Me too», que visa denunciar o assédio sexual das mulheres, sobretudo em lugares de trabalho, uma campanha que tem sido reforçada pelo testemunho de atrizes e atletas de diferentes gerações. Entretanto, na Igreja, de visita à América do Sul, o Papa volta a pedir perdão pelos abusos sexuais de alguns sacerdotes e pelo silêncio cúmplice da hierarquia. Estaremos afetivamente doentes?


A afetividade humana necessita de ser educada e norteada por valores humanos universais caso contrário o homem torna-se refém desta força inata. Quando ela é bem orientada, a afetividade é um dom precioso e indispensável na construção de relações saudáveis e na prossecução de objetivos que dão sentido à existência. Os especialistas nesta matéria deveriam trabalhar para detetar o “vírus da distorção afetiva” para que o espírito maligno não submeta o homem, a família, a comunidade, à escravatura e à perversão dos afetos. As causas podem ser variadas, mas não é alheia a atual cultura promovida pelos media assente na erotização das relações, o relativismo moral e nas relações sexuais precoces. Tudo parece normal… o mais importante é a satisfação dos impulsos, mesmo que o outro se converta num mero objeto.


Curiosamente, no início do Evangelho de Marcos deste domingo, Jesus expulsa com autoridade um «espírito mau» que domina o homem. O Seu programa missionário continua a ser o mesmo hoje: devolver a liberdade ao homem amputada pelo «espírito impuro». Essa força maléfica está entranhada no mundo e em nós. Precisamos de a identificar. Que o Senhor nos contemple com o dom da fortaleza para possamos vencer tamanhos combates.

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