A parábola do grão de mostarda – Um mundo novo numa semente…

Crónicas 14 fevereiro 2019  •  Tempo de Leitura: 6

As melhores notícias são sempre as que nos surpreendem, sem qualquer pré-aviso ou pista. As parábolas de Jesus são aquelas estórias de um Deus que nos espanta com assombros que brotam das experiências quotidianas mais banais da vida. Nos evangelhos, na continuidade da parábola do semeador, Jesus resolve narrar-nos uma outra semeadura, nada menos inesperada:

 

«O Reino do Céu é semelhante a um grão de mostarda que um homem tomou e semeou no seu campo. É a mais pequena de todas as sementes; mas, depois de crescer, torna-se a maior planta do horto e transforma-se numa árvore, a ponto de virem as aves do céu abrigar-se nos seus ramos.» (Mt 13,31-32 par.)

 

A maior parte dos intérpretes e autores identificam na parábola o princípio de que os começos modestos podem resultar em grandes feitos. E está certo. A proporção entre o que é semeado e colhido é nada menos que colossal, à semelhança da porção de semente que caiu em terra boa para depois frutificar, «umas, cem; outras, sessenta; e outras, trinta» (Mt 13,8).

 

Com efeito, o Reino de Deus começou na vida de Jesus de forma muito discreta, semelhante a um minúsculo grão de mostarda, – geralmente uma semente que não ultrapassa os 2 milímetros! – apenas com um punhado de discípulos e no contacto com os pobres e os esquecidos de Israel. Todavia, veja-se o caso da famosa «mostarda negra» (Brassica Nigra), cujo pé da planta pode chegar a atingir os 3 metros de altura. Essa é precisamente a imagem fortíssima que Jesus deseja estampar nos camponeses do século I, habituados ao labor da terra e, infelizmente também, à situação de pobreza e injustiça que os oprimia dia-a-dia. Jesus diz-lhes que eles fazem parte de algo maior, de um Reino que, semeado no meio deles, pode vir a tornar-se grandioso e soberano, mas ao mesmo tempo, diferente

 

De facto, a força e o dinamismo do evangelho abalaram as fundações das maiores instituições de poder da época: o Templo, a Lei de Moisés e o Império Romano. Jesus e a sua minúscula comunidade de discípulos revolucionaram de tal modo a religião (Mc 2,27), a forma como nos relacionamos com o próximo (Mt 22,36-40; Lc 6,36), com o dinheiro (Lc 16,13) e com a vida (Mt 16,25), que os ‘senhores de turno’ convocaram atabalhoadamente um julgamento sem testemunhas nem provas para o condenarem a uma morte violenta na cruz (Lc 23, 33-46). Mas, o que seria o fim de uma trágica história, pelo evento da ressurreição converte-se num feliz acontecimento universal, uma Boa Notícia pregada «a toda a criatura» (Mc 16,15), um vastíssimo mundo novo que não tem parado de expandir-se…

 

É sublime darmo-nos conta de que Deus não só pode realizar o prodígio de converter o bem minúsculo em Maiúsculo, mas sobretudo transfigurar o que começou connosco em algo totalmente imprevisível. É que, afinal a «maior planta do horto» (v.32) «transforma-se numa árvore» (idem). Mais do que um crescimento quantitativo, a parábola comunica-nos uma metamorfose qualitativa: a conversão em algo distinto e intensamente melhor do que estava programado, calculado ou esperado.

 

Jesus anseia revelar-nos que é assim mesmo, de forma oculta e discreta, que Deus trabalha e molda a nossa história de Salvação! O melhor está ainda para vir, sem o determinismo da lei ou da lógica humana. Não encontramos aqui um Deus milagreiro que opera mudanças por artes mágicas, mas um Deus Criador e Criativo, paladino em superar as nossas melhores expectativas. Ele é Fiel na Bondade e na surpresa. D’Ele só podemos esperar o inesperado, o delicioso choque de colher o que não semeamos, de ver crescer o que não nasceu como tal, de testemunhar a Beleza e Benevolência que desafiam todos os prognósticos…

 

Afinal, os maiores carrascos das sementes são os pássaros. Mas heis que, da mais frágil e mínima, brotou uma árvore tão magnífica que estendeu ramos para abrigar até os seus piores ‘inimigos’. Esta parábola faz-me lembrar outra contada pelo Padre Vasco Pinto Magalhães, s.j.:

 

«O mundo está cheio de surpresas que nos põem a caminho. Como aquela criança que olhava para o pai. Este dizia-lhe: "Vês aquela coisa grande, ali, alta, é uma árvore. E aqui - enterrava uma sementinha - vai nascer uma como aquela." A criança abria a boca de espanto e sorria. Acreditou. Não é que tivesse lógica, mas era o pai que dizia»

 

Que Mundo Este tão diferente, onde os pequenos e humildes se agigantam,

Onde plantas viram troncos que trepam as nuvens

Quando frágeis sementes ameaçadas por aves, convertem-se nas suas árvores de abrigo,

E toda a Criação rejubila e canta hinos de louvor

Porque já nasceu e cresce um Éden nunca antes visto, mas sonhado…

Mundo Este reconciliado, sem agenda nem programa,

Gerado pelo Amor fecundo do nosso Deus!

Gustavo Cabral

Cronista

Engenheiro mecânico. Mestrado em Ciências Religiosas. Atualmente, professor de EMRC. Leigo Redentorista. Adepto de teologia e bíblia.

Subscrever Newsletter

Receba os artigos no seu e-mail