Missa em Santa Marta: A força das mulheres

Vaticano 24 novembro 2017  •  Tempo de Leitura: 9

«Somente a força das mulheres é capaz de resistir a uma colonização cultural e ideológica»: testemunham-no a história, da Bíblia à resistência italiana e às ditaduras genocidas na Europa do século passado. E o segredo da capacidade das mulheres de defender com «coragem e ternura» a história de um povo está na transmissão da fé, apostando precisamente na memória e no dialeto, na capacidade de se fazer entender pelas crianças, ensinando-lhes os valores autênticos e salvando-as das «doutrinações». O Papa fez um verdadeiro elogio às mulheres na manhã de 23 de novembro, na missa em Santa Marta.

 

«Na primeira leitura — observou o Papa, referindo-se ao trecho litúrgico do primeiro livro dos Macabeus (2, 15-29) — ouvimos que continua a colonização cultural do rei Antíoco Epífanes: como sempre, cada colonização cultural e ideológica tem o mesmo estilo, e nós podemos vê-lo». Em particular, explicou, «um dos indicadores de uma colonização cultural é que tira a liberdade: aquele povo não tinha o direito de pensar; todos assim, pensa-se assim». E «outro indicador é anular a história, deixar de recordar», como se disséssemos: «a história começa comigo, agora, com a narração que faço neste momento, não com a memória que lhe transmitiram».

 

«O terceiro indicador é educativo», prosseguiu, salientando que «cada colonização cultural e ideológica impõe, quer impor um sistema educativo aos jovens. Sempre. E preocupa-se com isto». De resto, insistiu, «pensai no que fizeram as ditaduras do século passado aqui na Europa» e «qual era a sua preocupação: “O que fazemos com os jovens, façamos assim?».

 

«Eu — afirmou o Papa — não quero citar nomes. Vós conheceis bem os nomes que davam a estas escolas de doutrinação dos jovens: tira-se a liberdade, desconstrói-se a história, a memória do povo, impondo um sistema educativo aos jovens. Todas agem assim, algumas até com luvas brancas». E acontece, acrescentou, «que um país, uma nação pede um empréstimo» e a resposta que recebe é: «Dou-te, mas nas escolas deves ensinar isto, isso e aquilo». Eis, «indicam-te os livros que anulam tudo o que Deus criou e como o criou. Cancelam as diferenças, anulam a história: a partir de hoje começa-se a pensar assim, e quem não o fizer será deixado de lado e até perseguido».

 

Foi precisamente esta «a história da colonização cultural e ideológica que o povo de Deus sofreu, quando alguns dos seus membros instauraram estas ideias: ela tira a liberdade e introduz a perseguição». Com efeito, «vimos que os fiéis são perseguidos: até aqui na Europa, no século passado, quantos se opunham às ditaduras genocidas eram perseguidos». Mas «ainda hoje, há alguma colonização cultural com luvas brancas: se não fores por este caminho, aquele lugar não será teu, será para outra pessoa, não consegues progredir na vida, condicionam-te a existência. É outra forma de tortura. Tiram-te a liberdade».

 

E não só, porque «depois te tiram a memória», disse o Pontífice. É assim mesmo, «nenhuma memória: são fábulas. Nada! Eis a narração que construo para vós: deve-se crer nisto, a história começa connosco, o que passou é mentira, coisas de velhos».

 

«É interessante — sugeriu o Papa, referindo-se à vicissitude bíblica dos irmãos Macabeus — a palavra que a mãe diz ao filho mais jovem: “Mostra-te digno dos teus irmãos” — “Mostra-te digno do teu povo. Tem memória. Não a regateies». É um convite, afirmou, a «guardar a memória: a memória da salvação e do povo de Deus, aquela memória que fortalecia a fé do povo perseguido pela colonização ideológico-cultural». E «é a memória que nos ajuda a derrotar qualquer sistema educativo perverso: recordar os valores, a história, aquilo que aprendemos».

 

Na sua reflexão, Francisco quis meditar de novo sobre a figura da mãe: «O texto diz que a mãe falava duas vezes “na língua dos pais”: falava em dialeto. E não existe colonização cultural alguma que possa vencer o dialeto». O dialeto «tem raízes históricas».

 

Portanto, prosseguiu, «a mãe “falava na língua dos pais”, em dialeto, e por isso o rei não entendia, o intérprete não compreendia». E falava, explicou, «temperando a ternura feminina com uma coragem viril: isto faz-nos pensar que só a força das mulheres é capaz de resistir a uma colonização cultural». Uma palavra, “resistência”, que «aqui na Itália tem um profundo eco histórico, e que soube vencer aquelas colonizações».

 

«Até hoje estamos diante de muitas colonizações que querem destruir tudo e começar de novo», disse o Papa. Colonizações das quais já resultam novos «valores» e «a história começa aqui», o resto «passou». Exatamente o que ocorreu «com Antíoco Epífanes, acontece cada vez que na terra surge uma nova ditadura cultural ou ideológica, que é uma colonização». Mas «duas coisas defendem-nos sempre: a memória e o dialeto». E «quem leva em frente a memória e o dialeto? As mulheres, que são mais fortes que os homens».

 

«Olhando para esta mulher — afirmou Francisco — pensemos: como se transmite a fé? Em dialeto! A fé verdadeira aprende-se dos lábios da mãe, aquele dialeto que só a criança pode conhecer». Depois, «os teólogos a explicarão, mas a transmissão deriva dali». E «este é um exemplo do modo como as mães, as mulheres, são capazes de defender um povo, a história de um povo, os filhos: transmitir a fé».

 

«Se Eleazar — disse o Papa, referindo-se à figura bíblica, sempre ligada ao livro dos Macabeus, proposta de novo nos dias passados pela liturgia — se tornou raiz para os jovens, contra a raiz perversa que era Antíoco Epífanes, esta mulher fez-se memória: memória que desperta tudo o que foi semeado quando éramos crianças e que não se pode negociar, não se pode ceder às propostas de qualquer colonização cultural». De resto, reconheceu o Papa, «o povo de Deus foi em frente com a força de muitas mulheres corajosas, que souberam transmitir a fé aos filhos, e somente elas — as mães — sabem comunicar a fé em dialeto».

 

Concluindo, Francisco desejou na oração «que na Igreja o Senhor nos conceda sempre a graça de ter memória, de não esquecer o dialeto dos pais e de poder contar com mulheres corajosas».

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